Agricultura Familiar
- junho 13, 2023
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Não se separam as ideias de agrosustentabilidade, agrofloresta, agricultura familiar e, MST, Embrapa e a tal moda pop reducionista (modelo exportação) do business...
Não se separam as ideias de agrosustentabilidade, agrofloresta, agricultura familiar e, MST, Embrapa e a tal moda pop reducionista (modelo exportação) do business...
por Sandro Messikommer
Zurich, Suíça, 13/06/2023
3 Minutos.
A Agricultura familiar é definida como o negócio do agregado familiar (família) em que as funções importantes (capital, gestão, organização, produção, vendas, administração) são realizadas total ou principalmente por membros da família.
Família não é só nuclear como pensam alguns, que se acham modelo de perfeição universal familiar porque sua casa tem a formação de um homem, uma mulher e filhos. A origem etimológica da palavra família, vem do latim famulus, quer dizer escravo doméstico.
Familia era então, todos que estavam em conjunto em uma mesma área demarcada, composta por escravos pertencentes e dependentes de um chefe ou senhor patriarcal, (pater, pátria, patrimônio, pai). Assim, a família greco-romana, era formada por um patriarca e seus famulus: esposa, filhos (de sangue), servos livres e escravos.
Eu, como docente e pesquisador, afirmo que a família como é conhecida atualmente teve sua origem na civilização romana, tomando como ponto de partida o modelo familiar patriarcal hierarquizado. Seguindo F. Engels (1984, p. 61):
“O elo familiar era voltado apenas para a coexistência, sendo imperioso para o “chefe” a manutenção da família como espelho de seu poder, como condutor ao êxito nas esferas política e econômica. Os casamentos e as filiações não se fundavam no afeto, mas na necessidade de exteriorização do poder, ao lado – e com a mesma conotação e relevância – da propriedade. […] Os vínculos jurídicos e os laços de sangue eram mais importantes e prevaleciam sobre os vínculos de amor.
O afeto, na concepção da família patriarcal, era presumido, tanto na formação do vínculo matrimonial e na sua manutenção como nas relações entre pais e filhos. Quando presente, não era exteriorizado, o que levava a uma convivência formal, distante, solene, substanciada quase que unicamente numa coexistência diária.”
Uma forma especial de exemplo vivo disso é a agricultura familiar, na qual o capital e a gestão estão nas mãos da família. Aqui na Suíça dos séculos 19 e 20, esta era a forma típica de negócio na agricultura e no artesanato, que se difundiu no setor industrial .
A agricultura familiar tem suas raízes na economia rural familiar dos lavradores da Idade Média (casa inteira).
Na primeira fase da revolução industrial, a modernização ocorreu no setor agrícola ( Revolução Agrícola) no mesmo nível da empresa industrial. O número de grandes empresas baseadas no trabalho assalariado cresceu, principalmente nos centros urbanos.
No entanto, este padrão de desenvolvimento atingiu os seus limites no último quartel do século XIX. A depressão (depreciação) dos preços agrícolas e a tendência ascendente dos salários, pagos aos trabalhadores agrícolas, impulsionaram e concentraram as explorações agrícolas na mão-de-obra familiar.
Com essa “equidade” puderam competir com as grandes explorações baseadas no trabalho assalariado industrial.
Dentre as razões principais o crescimento do uso de recursos agrícolas, ainda largamente de base biótica, tem estado sujeito às restrições dos ciclos de renovação biológica de plantas e animais. Além da otimização – produção industrial -, em que os fatores de produção mudaram desde o consumo de recursos não renováveis no início do século XIX. Entretanto, a utilização constante de recursos naturais durante este século não foi possível na agricultura. Assim, a forma industrial de produção não poderia ser integralmente transferida para o setor agrícola.
No momento em que as operações em larga escala avançaram (com o impulso da tecnologia saída das fábricas e das descobertas da engenharia científica), esse tipo de fazenda voltou a desaparecer no setor agrícola. Houve uma verdadeira “campesinização” da produção de alimentos para a população urbana em rápido crescimento.
As grandes fazendas só sobreviveram na Europa onde a industrialização quase não ocorreu ou onde os custos para os trabalhadores agrícolas não empresariais puderam ser mantidos efetivas e particularmente baixos pelas medidas estatais repressivas e a geração de um exército de desempregados que também resultou em trabalhadores sazonais baratos.
Mesmo na Suíça, onde havia apenas algumas grandes empresas, estas (como as empresas menores) sofreram pressão: seu número declinou até a década de 1950. A empresa familiar, tão característica da agricultura do século XX, não se constituiu por uma alta estima ideológica. Ela resulta, no final do século 19 século, como o modelo que impeditivo do acesso à terra das grandes massas da população, e da ausência de planejamento regulador das forças do mercado, ao sabor dos interesses das classes senhoriais dominantes.
Somente quando está ciente de sua capacidade de realizar-se é que a política agrícola avança na base modernizante da agricultura do século XX.
No entanto, o exagero ideológico não impediu que as fazendas familiares rurais (o conjunto de pessoas interessadas em trabalhar na terra e de lá retirar sustento e dignidade) se transformassem em empresas individuais, desde a década de 1960.
O Brasil tem 800 milhões de hectares em sua extensão total, e mais da metade disso não são terras agricultáveis, pois nós temos as matas e florestas, temos as cidades, temos também estradas, áreas de proteção ambiental necessárias, parques públicos e privados, e tudo aquilo que ocupa a terra e não permite que seja agricultável ou plantada.
Diante disso, cálculo estimado, sobram para agricultura 360 milhões de hectares. Os agricultores “brasileiros” cultivam cerca de 80 milhões, produzindo soja, milho, arroz, e criações, esta ainda que de pequena monta (gado – bovino leiteiro, suíno, caprino, equino e aves), algodão, frutas, feijão etc.
Desses 80 milhões de hectares 60 milhões estão ocupados pelo agronegócio (que se diz pop) e os outros 20 milhões deveriam estar destinados à agricultura familiar, pessoas que fazem parte de assentamentos que lutam pelo acesso à terra, como o MST.
Desta forma, percebe-se ainda sobram 280 milhões de hectares. Desses, pelo menos 160 milhões comportam a pecuária. Produtores desmatam e utilizam a terra para criação de pasto para alimentação de rebanhos de gado – pecuária de corte. Ainda assim, de acordo com o Incra, 120 milhões de hectares são terras improdutivas, e servem para a especulação imobiliária.
Portanto, numa aritmética simples, fossem assentados em 10 hectares uma família produtora, o que seria mais do que o suficiente. Apoio, educação e tecnologia para produção (cooperativas funcionais e regulares). Assim, o Incra atenderia 12 milhões de famílias. Estima-se em 4 milhões o número de famílias sem terra.
Sandro Messikommer – de Zurich – Suíça para AEL
Professor internacionalista – Doutor e Pesquisador.
[N.E.: Dados complementares para serem lidos e compreendidos sistematicamente:]
Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/333537/mod_resource/content/0/ENGELS_A%20origem%20da%20familia.pdf.
Desigualdade na distribuição de terras brasileiras:
https://www.idace.ce.gov.br/2020/05/13/estudo-mostra-o-mapa-da-desigualdade-da-distribuicao-de-terras-no-brasil/
Venda de terras para estrangeiros: https://agraria.fflch.usp.br/sites/agraria.fflch.usp.br/files/upload/paginas/TERRAS%20DE%20ESTRANGEIROS%20NO%20BRASIL.pdf
Grilagem criminosa em terras brasileiras:
https://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/download/581/517/1969?inline=1
O que é a Reforma agrária:
https://www.politize.com.br/o-que-e-reforma-agraria/
A violência no campo e o silêncio dos proprietários da mídia :
https://journals.openedition.org/confins/21168