CiênciasDestaquesMeio AmbientePolíticaSaúdeSaúde AlimentarSociedade

Drogas na Mesa e Câncer

Efeitos colaterais tóxicos de um acordo de livre comércio Reino Unido-Brasil são revelados em um relatório divulgado recentemente pela Pesticide Action Network (PAN-UK), em que um potencial acordo comercial entre o Reino Unido e o Brasil está sendo considerado.

Mônica Picinnini

Londres, 23/o2/2022.

2 Minutos

Se um acordo comercial entre os dois países for adiante, a população do Reino Unido poderá estar consumindo produtos com maior nível de pesticidas, o que pode ter um impacto direto não apenas na saúde pública, mas também no meio ambiente.

“O secretário de Comércio do Reino Unido está promovendo o comércio com o Brasil como ‘oportunidades reais para avançar no comércio verde’. Enquanto isso, o uso excessivo de pesticidas altamente tóxicos no Brasil está contribuindo para a destruição da Amazônia e de outros ecossistemas de importância crucial, contaminando a água e envenenando trabalhadores rurais e comunidades.

E, no entanto, o governo não forneceu detalhes sobre como garantirá que os alimentos brasileiros vendidos nas prateleiras do Reino Unido não contribuam para a crise global do clima e da natureza”, disse Josie Cohen, chefe de políticas e campanhas da Pesticide Action Network, PAN UK.

O Brasil é o terceiro maior usuário de agrotóxicos do mundo, atrás apenas da China e dos EUA, permitindo quase o dobro da quantidade de agrotóxicos altamente perigosos, HHP’s (131), em comparação com o Reino Unido (73). Por exemplo, os limões cultivados no Brasil têm 200 vezes a quantidade de dimetoato inseticida do que no Reino Unido. O dimetoato tem sido associado ao câncer e é proibido no Reino Unido.

Drogas na Mesa e Câncer
O Brasil importou mais de 300 tipos de venenos com autorização da ministra e do presidente.

O Reino Unido já importa grandes quantidades de alimentos (carne, frutas e vegetais) e soja para ração animal do Brasil. As importações de alimentos estão sujeitas aos limites de segurança do Reino Unido para a quantidade de resíduos de pesticidas permitidos para um item específico, mas não há limites para a ração.

A soja é a maior exportação do Brasil para o Reino Unido, com valor aproximado de US$ 220 milhões em 2020. A maior parte é geneticamente modificada (GM), e pelo menos 90% é alimentada para animais.  Uma grande quantidade de carne que os britânicos compram, incluindo carne bovina, laticínios e frango criados no Reino Unido, foi alimentada com soja cultivada em terras desmatadas usando pesticidas tóxicos.

“A maioria dos consumidores do Reino Unido não tem ideia de que parte da carne que estão comendo foi alimentada com soja cultivada com produtos químicos altamente tóxicos. No momento, o governo do Reino Unido está falando bem na redução dos danos causados ​​pelos pesticidas no Reino Unido, mas parece não ter problemas em exportar nossas pegadas ambientais e de saúde humana para o Brasil”, disse Vicky Hird, Coordenadora da Campanha de Agricultura Sustentável da Sustain. 

Em fevereiro de 2021, o Defra assinou um “memorando de entendimento” com o governo brasileiro com a intenção de facilitar o comércio do agronegócio entre o Brasil e o Reino Unido. A ministra da agricultura brasileira, Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias, apelidada pelos brasileiros de “musa do veneno”, disse que o Reino Unido acabaria se tornando mais alinhado às regras internacionais de segurança alimentar.

“O governo do Reino Unido continua buscando aumentar o comércio agrícola com o Brasil, mas a intensificação da produção agrícola tem sido associada ao desmatamento e pesticidas altamente perigosos que prejudicam a vida selvagem e os ecossistemas. O Reino Unido deve garantir que não está contribuindo para o problema”, disse a Dra. Emily Lydgate, especialista em direito ambiental da Universidade de Sussex.

O atual presidente do Brasil, J.B., desenvolveu continuamente uma relação próxima e especial com os agrotóxicos. Recentemente, ele incorporou um decreto presidencial (10.833/2021), alterando a lei de agrotóxicos de 1989, flexibilizando ainda mais o processo de aprovação de agrotóxicos, incluindo a aprovação de produtos químicos que já foram proibidos nos EUA e na Europa. Com a nova emenda, os produtos químicos que causam câncer, mutações genéticas e malformações fetais terão aprovação para serem usados ​​e fabricados, se for determinado um “limite de exposição seguro”.

Adicionalmente, a atual legislação brasileira não prevê um prazo mínimo para a renovação do licenciamento de agrotóxicos. Agrotóxicos que estão no mercado brasileiro há mais de 4 décadas continuam sendo usados ​​até hoje, sem nunca passarem por uma avaliação de questões ambientais e de saúde.

O processo de aprovação de agrotóxicos no Brasil nunca foi facilitado, pois foi dado mais poder ao Ministério da Agricultura na tomada de decisão, deixando ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) excluídos da decisão final.

Se é POP não é Agro

Um aumento nas exportações agrícolas do Brasil para o Reino Unido também pode representar uma ameaça à agricultura britânica, aumentando a pressão sobre os agricultores para aumentar o uso de pesticidas para competir com produtos mais baratos cultivados em maior escala. A produção de carne bovina e soja no Brasil desempenha um papel importante no desmatamento da floresta amazônica, bem como na devastação da região do Cerrado, lar de 5% das espécies vegetais e animais do mundo.

Os agrotóxicos também contaminaram a água brasileira. De acordo com um estudo de 2021 , os corpos de água doce em 80% dos estados brasileiros estão agora contaminados com herbicidas como o glifosato, representando uma ameaça direta às espécies e ecossistemas aquáticos.

A água potável no Brasil pode conter níveis de glifosato de até 500 microgramas por litro. No Reino Unido, a medida aceitável para água potável é de 0,1 micrograma por litro, 5.000 vezes menor que o nível no Brasil.

Outra catástrofe relatada regularmente são os inúmeros incidentes de intoxicação no Brasil causados ​​por pulverização aérea de agrotóxicos. Um relatório publicado pela Publica estimou que entre 2007 e 2017, pesticidas envenenaram aproximadamente 6.500 crianças, todas com menos de 14 anos.

Covid19. Relações perigosas.

Além disso, um novo estudo realizado em células das vias aéreas do pulmão humano é um dos primeiros a mostrar uma ligação potencial entre a exposição a pesticidas organofosforados e o aumento da suscetibilidade à infecção por COVID-19.

“Identificamos um mecanismo básico ligado à inflamação que pode aumentar a suscetibilidade à infecção por COVID-19 entre pessoas expostas a organofosforados”, disse Saurabh Chatterjee, PhD , da Universidade da Carolina do Sul e especialista em pesquisa em saúde do Columbia VA Medical Center e líder da equipe de pesquisa.

A Pesticide Action Network UK fez algumas recomendações importantes ao governo do Reino Unido, incluindo a implementação de medidas adicionais para garantir que as importações agrícolas brasileiras não causem danos relacionados a pesticidas à saúde humana ou ao meio ambiente no Brasil.

Outra proposta seria não permitir qualquer enfraquecimento dos padrões de pesticidas do Reino Unido como resultado de um aumento no comércio com o Brasil e impedir que os agricultores do Reino Unido sejam prejudicados por importações de alimentos baratos produzidos com padrões de pesticidas mais fracos no Brasil.

O impacto que os agrotóxicos causam à nossa saúde e ao meio ambiente é inegável. Não afeta apenas a vida humana, mas também a floresta amazônica, o Cerrado, o solo, o ar, a vida selvagem e a água, acelerando a destruição dos ecossistemas mais preciosos do mundo.

Só temos uma vida e um planeta. É nosso dever protegê-los para garantir nossa sobrevivência!

Mônica Picinnini

Compartilhar

Redação

ÆscolaLegal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve, com foco crescente em Educação 4.0 e além, Tecnologia/Inovação, Sustentabilidade, Ciências e Cultura Sistêmica. Publisher: Volmer Silva do Rêgo - MTb16640-85 SP - ABI 2264/SP