Sustentabilidade

SÃO PAULO, UMA CIDADE SEM ESCOLAS – tem futuro?

O Publisher

São Paulo – 13/07 de 2020

4,5 Minutos

Mapas servem para diversas finalidades. Não só aquelas que aprendemos nas aulas básicas da Geografia nos primeiros anos do ensino fundamental e médio, mas a partir da integração com as TICs presentes no modelo de Educação 4.0, suas utilidades se ampliaram indefinidamente.  É comum dizer hoje que já podemos mapear o cérebro humano, as rotas estelares, os códigos genéticos dos seres vivos.

Estudos realizados pelas equipes multidisciplinares do NEV da USP – feitos por doutores, professores especialistas e pesquisadores com apoio de geoprocessamento de dados, mostram diversos mapas interessantes da localização e da quantidade de escolas públicas e privadas na capital de SP por regiões. Sem escolas, qual será o futuro dos jovens?

Os números parecem ser impressionantes, mas não passa de uma ilusão. A fonte é Cadastro de Escolas da Rede Estadual, Municipal e Particular da Capital. INEP 2002, SEESP. Embora date de 18 anos atrás, servirá para entender o raciocínio ao qual se propõe este texto. Àquela época a população da capital era de 10.500.000 habitantes.

São Paulo ( considerando a grande São Paulo) tem atualmente pouco mais de 12 milhões de habitantes segundo as estimativas divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),  e observando o seu mapa e considerando que cada escola pública tem em média 900 alunos distribuídos em dois turnos – manhã e tarde.

Se fizermos as contas, notaremos que o déficit é imenso, e que os investimentos públicos na área são pífios, considerando também as necessidades cada vez crescentes e móveis, as pessoas crescem e precisam de outras escolas, embora o crescimento demográfico, ainda de acordo com o IBGE tenha sido de apenas, 0,57% comparado ao período auferido anterior.

Escolas estaduais e municipais, públicas e privadas na capital paulista (INEP 2002 – SEESP)

No entanto, infelizmente os outros municípios do país, carecem de tais índices e ferramentas de aferição. Experimentamos assim uma espécie de apagão geoestratégico e educacional que nos mostre o que realmente é o Brasil neste sentido. Talvez o MEC (nenhuma referência à Educação 4.0).

Já que o estado, como instituição, não faz por razões diversas a sua parte devida com a arrecadação dos impostos (a prestação de serviços), ainda que tenha alto poder de investimento através de seus bancos, central (o regulador), o comercial e o de fomento e suas agências, encontram-se no setor privado, nas pessoas, individualmente, os responsáveis pela movimentação econômica da sociedade ainda que descontroladamente.

Ou seja, ambos tem demonstrado várias vezes serem, nas sua maioria, incapazes de autogestão sem uma presença reguladora (uma Pedagogia da Economia, como propôs recentemente o economista , professor da PUC/SP e consultor da ONU Ladislau Dowbor) mas que acabam, naturalmente, por ocupar os espaços deixados por diversas e também descontroladas gestões municipais.

Trata-se, claro, de uma questão administrativa, de regulação jurídica e de políticas públicas, muito mais do que a existência de recursos econômicos\financeiros, considerando dentre outras questões, que corre solta a falácia que o estado arrecada pouco e mal.

Fala-se pouco dos juros da dívida pública, dos que pegaram dinheiro da sociedade, com o BNDES e outras instituições internas e externas e que transformaram seus empréstimos em dívidas para o país.

Educação e Saúde, talvez sejam as duas mais importantes e estruturadas políticas públicas e de planejamento do país há décadas, e requerem imenso potencial de planejamento, intensos processos de análises, pesquisas, ações e busca por resultados.

Os resultados da Educação, porém, não são mensuráveis no final do mês, ou mesmo ao final do ano fiscal – geralmente estes índices são medidos por geração – traduzindo em miúdos, o que gera de mão-de-obra qualificada e formada em escolas de qualidade para substituir os nossos aposentados, ou naquelas medições com jeito de competições nacionais e internacionais: os internos IDEB, PISA (do INEP) que ranqueiam os estados, e os de fora IDH, índices GINI, The Learning Curve (Curva do Aprendizado, em inglês), realizado pela The Economist Intelligence Unit (EIU) e Pearson Internacional etc., que criam os rankings internacionais.

Por se tratarem de políticas públicas numa sociedade republicana e democrática, em que as fatias do poder se distribuem de forma heterogênea, as questões da Educação se veem, no mais das vezes, emaranhadas em intrincados cipoais ideológicos e interesses múltiplos que só podem ser resolvidos democraticamente pelas ações políticas dos inúmeros atores sociais envolvidos, desde os alunos, os professores, os gestores e os profissionais ligados a área, aos políticos e os empresários, já que a grande parte da sociedade civil usa o serviço público, e também, quando podem, os mesmos oferecidos pelo setor privado.

Ambos os setores, público e privado, sabem destas imperiosas necessidades – a de consultar sempre os pais de seus alunos, os que pagam as matrículas e mensalidades das escolas de educação convencional do sistema particular\privado – ou, no jargão mais sociologizado a ‘comunidade’, (em resumo quase a mesma coisa, ‘já que alguns são mais comuns do que outros’), sabido que os pais que trabalham tem seus impostos descontados (mesmo aqueles na informalidade – segundo cálculos atuais do IBGE atualmente beirando os 41% da população economicamente ativa do país – um rombo na arrecadação) e, eles como pais, pretendem que estes impostos retornem na forma de serviços públicos com qualidade  satisfatória – escolas boas para seus filhos – públicas e “gratuitas”, talvez laicas.

Porém, apenas agindo de forma conjunta, pelo bem maior da sociedade é que se pode chegar a um consenso, a uma resposta, corrigir as distorções e definir as ações adequadas para o enfrentamento destes problemas. E os 17 ODS do Milênio, propostos em 2015 pela UNESCO dão um norte até 2030, temos, portanto, ainda dez anos para buscar soluções.

Os caminhos são vários, desde a organização de grêmios estudantis nas escolas da educação básica, fundamental e médio, orientados pelos professores, que enfrentam de forma coletiva os problemas comuns das unidades escolares, e deste senso comum encontram soluções locais, com o que poderão, didaticamente e de forma progressiva também se inteirar das questões mais globais, para crescer na direção da cidadania plena. 

Só que alguém tem de injetar recursos, e muitas escolas públicas recorrem às APMs (Associações de Pais e Mestres) – um esforço coletivo da comunidade, pais e professores para manter a escola minimamente funcional. As somas, contudo, são irrisórias, girando normalmente em torno dos três dígitos.

Por sua vez, os professores também se organizam em suas associações profissionais (os sindicatos representam os profissionais das diversas categorias trabalhadoras – e trabalhadores são sociologicamente definidos como uma classe social, numa leitura/colocação histórico marxista dialética), para definirem suas posturas nas lutas e bandeiras por melhores condições de ensino, estrutura e planejamento profissional em sua vida pessoal e em suas carreiras docente profissional.

Desastrosamente, as ações dos governos recentes os tem posto em forte desencanto, promovendo com uma estratégia de esvaziamento um consequente enfraquecimento de sua capacidade mobilizadora.

Os estrategistas defensores do estado mínimo, ou de nenhum estado, entretanto, a despeito dos cortes dos investimentos perigosamente nocivos feitos nas áreas de Educação e Saúde, não parecem ter os substitutivos suficientes e necessários para ocupar os espaços deixados pelo desmonte atual promovido, a não ser a avidez do mercado nacional e internacional, a fatia do empresariado ligado ao setor que tem se mostrado disposto a investir, sem que se deem conta, ou façam alarde do pressuposto básico de uma empresa: o lucro.

Ainda assim não se demonstraram estar muito interessados, como aquela raposa que viu as uvas verdes. E o básico, as estruturas físicas já estão prontas, 90% das escolas públicas de São Paulo tem terrenos mínimos com 5 mil m².

Espaço suficiente para uma escola considerada pequena, aquela que suporta até 900 alunos e absorve a mão de obra de cerca de 70 professores, além da gestão, da coordenação pedagógica e dos funcionários da secretaria e da manutenção, em dois turnos estabelecidos de acordo com a procura – manhã e tarde – e geralmente assim distribuídos: ensino médio pela manhã e ensino fundamental I ou II a tarde.

Para um empresário de baixo nível (aqueles sem responsabilidade social efetiva) a conta simples já satisfaz: se cada aluno pagar mil reais por mês, ele fatura novecentos mil por mês, fora a matrícula. Mas, é bom ter em mente a seguinte exigência: o conhecimento só promove transformações e produtividade positiva em escala se compartilhado.

Os pensadores pertencentes às classes sociais mais abastadas, (também definida pelos conceitos históricos marxistas dialéticos como, a classe média prestadora de serviços, e os mais acima como sendo os proprietários dos meios de produção), entenderam o quadro complexo onde estacionou a Educação no país, e agora busca investir na Sociedade do Conhecimento, ou seja, na Educação e o trabalho 4.0, pilares  e suporte da nova Revolução Industrial.

Esta apropriação binária (falsamente reducionista) das descrições e classificações sociais teve seu eixo deslocado e desfocado, porém, só vai deixar de ser a mesma e  reformular as  estruturas que a suportam, se e somente se o acesso à Educação 4.0 se concretizar de forma ampla, justa e equilibrada entre toda a população das cidades, e claro, do país.

Isto quer dizer, o estado tem de fazer investimentos maciços na Educação, a partir da renovação e acompanhamento constante das estruturas funcionais de suas unidades escolares – dos prédios à formação continuada de alunos e seus quadros docentes, passando por salários, benefícios e evoluções nas carreiras – as escolas deixarão assim de ser apenas locais de reprodução de conhecimentos já prontos e enciclopédicos oferecido, formadoras de beletristas, bacharéis e acadêmicos diplomados e diletantes, como os ginásios do final do século XIX e primeiro quartel do XX, para se tornarem um centro produtor e disseminador de novos conhecimentos.

A nova era da tecnologia dos computadores, propõe revoluções constantes a cada dia. A Educação 4.0, com o suporte destas inovações tecnológicas vai alterar drasticamente os meios sociais, das salas de aulas e escolas, às famílias, aos ambientes de trabalho e toda a estrutura da sociedade em suas relações ordinárias e especiais, assim como foram no passado a descoberta do fogo, a invenção da roda, da tipologia de impressão em papel e da imprensa, da máquina vapor, da eletricidade, do rádio e da TV….

Os dispositivos eletrônicos, chips e condutores cada vez menores, a nano conectividade e os algoritmos que facilitam as transferências de conhecimentos, simultaneamente em diversos pontos e ao mesmo tempo equidistantes do centro emissor, seja onde este centro estiver (portanto, o centro é deslocável rapidamente) por exemplo, tendem a gerar um tráfego gigantesco, inominável, uma malha envolvente de dados, que organizados geram informações, e nas mãos de estudantes e professores, em escolas bem preparadas para tal, se transformam em conhecimento aplicável, renovável, aplicados em realidade palpável, produtos, experiências, testes inovadores, todos frutos da criatividade estimulada dos alunos e da perseverança e dedicação dos professores.

Dispositivos de comunicação, robôs e automação industrial, impressão 3D, trabalho remoto, 5G etc., são as novas ferramentas do futuro e elas facilitarão a substituição de milhões de pessoas em seus postos de trabalho. Evoluíram implacável e inicialmente como peças de substituição ao uso da força de tração animal, e agora o farão com os humanos.

A força física pertence e será feita pelas máquinas. E não há porque espernear, é inadiável! A serra substituiu o machado, e o raio laser a serra. Mas, um humano ainda as manipulará. Isso é a base da Economia 4.0 e nenhum país, minimamente inteligente, quer perder este trem da história.

Os alunos da Educação 4.0, matriculados e frequentadores das escolas preparadas para isso (eis onde entra a presença efetiva e exerce sua força o estado que se ocupa com seus cidadãos, em consonância com os empresários produtivos e responsáveis) serão os construtores destas ferramentas e eles serão, em grande parte, os profissionais que usarão estas ferramentas.

Ele nem precisarão ir tanto às escolas, poderão acessar suas aulas de onde estiverem no tempo que quiserem. A questão será novamente o valor financeiro de cada aula e quem as poderá pagar (a escola e a educação pública devem ser, desta forma, preservadas orientadas em altos níveis – para poder gerar ou oferecer espaço a competitividade saudável entre os estudantes do país.)

O modelo econômico, a riqueza e a prosperidade do país dependem fundamentalmente da Educação e da quantidade de alunos preparados para evoluírem aos graus superiores, gerando mais e mais conhecimento e agregando valores aos já apresentados, sinergicamente na enorme estrada sem volta rumo ao futuro.

Entretanto, esta Educação 4.0 e o Trabalho 4.0 (não se os pode separar) de qualidade, gratuita, ‘laica’ (será?) e com acesso garantido a todos, só vai funcionar se as escolas forem também um motor de compartilhamento desta nova “mercadoria” que egoisticamente o empresariado privatista atual (quer sair na frente, como sempre) o almeja e pretende só para si, forçando o estado a abandoná-la, pelo uso constante de pressões parlamentares, modelos enviesados de conduta econômica e controle dos meios de comunicação de massas, truques midiáticos e jurídicos (conhecidos como lobby). 

Tudo indica, no entanto, e dentro de um visão otimista e até idílica de um “novo capitalismo”, com vertente social dedicada e atuante (empresas assumindo a sua parte da responsabilidade social – leis e fiscalização funcionando -, e há que se levar a sociedade, como um todo, para esta discussão em busca de consensos), existir espaço para os dois cuidarem de seus jardins.

Quem define é o estado. Ele propõe as leis que autorizem as tais ppps (parceiras público privadas) e define as regras. E para existir um estado que proteja a sociedade dos ataques dos tubarões tem que existir as escolas e a Educação. Sem isso o país tenderá, e seguramente estará, novamente na turma do fundão.

O grau de preocupação do Ministério da Educação e da Ciência e Tecnologia após uma busca e mostrados aqui podem ser um indicativo da verdadeira dimensão da vontade política dada por este governo de aprofundar-se na questão da Educação 4.0  e no futuro do Brasil e de seus jovens.

Dados e números atualizados da situação das escolas na capital de São Paulo podem ser encontrados aqui:
http://dados.prefeitura.sp.gov.br/group/educacao

aqui: http://www.capital.sp.gov.br/cidadao/educacao

e aqui: http://eolgerenciamento.prefeitura.sp.gov.br/frmgerencial/NumerosCoordenadoria.aspx?Cod=000000

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Redação

ÆscolaLegal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve, com foco crescente em Educação 4.0 e além, Tecnologia/Inovação, Sustentabilidade, Ciências e Cultura Sistêmica. Publisher: Volmer Silva do Rêgo - MTb16640-85 SP - ABI 2264/SP

One thought on “SÃO PAULO, UMA CIDADE SEM ESCOLAS – tem futuro?

  • Diego Aires Silva do Rêgo

    Texto muito instrutivo. Esta revista está trazendo boas informações. Continuem assim! Parabéns a equipe.

Fechado para comentários.