Halloween – Caçamos “Bruxas” no Brasil
- novembro 1, 2021
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Festividades que comemoram a caça, a prisão, as torturas e atrocidades contra mulheres que não dependiam dos homens não tem
São Paulo, 01/11 de 2021.
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A ignorância de muitos e o furor comercial, a ganância e a procura por dinheiro, tornam este tipo de comemoração uma das mais curiosas idiotices importadas a título de diversão, sem considerar as raízes preconceituosas e em geral criminosas de sua existência e manutenção.
Ninguém mais sai caçando bruxas por aí. Não da forma tradicional que ainda se vê em filmes classe C da indústria cultural norte-americana e europeia (de fato, os locais onde nasceram e vigoraram as práticas medievais que consagraram tais eventos sanguinários com atos de extrema crueldade.) Prender, torturar, queimar, decepar membros, degolar e outras atrocidades contra as mulheres que não seguiam as normas ditadas pela igreja e por homens e mulheres moralmente deformados, ainda que tentassem mostrar o contrário, foi durante muito tempo um espetáculo de horror e poder.
Para as “festividades” (os eventos eram vistas assim) acorriam milhares de pessoas interessadas em assistir , e não poucas eram as mulheres que se diziam virtuosas, crentes, amantes de jesus e tementes à Igreja que iam lá se ‘divertir’. De fato, a Igreja era a instituição mais poderosa no combate às maldades do espírito; às distorções da alma cristã e da religião imposta e sustentada pelo estado nobre e militar que recolhia impostos dos moradores dos burgos, habitantes do entorno dos castelos feudais e dos monastérios, abadias e templos religiosos, organizações que junto com o rei e os senhores feudais representavam o poder.
Hipocrisia e poder, claro. Sabe-se, e estudos antropológicos já o demonstraram, de milhares na França, na Inglaterra, na Itália, na Espanha e em Portugal. Os relatos são numerosos. E os fatos atravessaram o Atlântico, para o novo mundo.
Embora nas entrelinhas, o Leviatã de Thomas Hobbes deixa clara a forma de poder e o relacionamento entre as categorias humanas (não creio que fossem ainda classe sociais, como as temos hoje – ricos proprietários de terras e bens de um lado e trabalhadores – despossuídos – de outro, e que suportavam o formato estamentário da época. De fato, neste sentido, pouco mudou – o direito a herança ainda é uma prática secular eivada de estupidez.) Vem de lá uma expressão cunhada pela percepção humana da barbárie: “o homem é lobo do homem“.
Mulheres eram jogadas na fogueira por cometerem heresia, ou seja, por serem contrárias ao modelo da doutrina, a toeira e/ou das práticas determinadas por um grupo de poder, religioso ou não. Saiu da linha estava condenada às mais duras penas, e não dificilmente à morte. O hábito provêm de culturas mais antigas à idade média. A raiz está na folha da parreira que cobria o sexo de Eva. Dali pra frente sofreu diversos “refinamentos”.
Os motivos eram diversos: “traiu o marido, ou não precisava de um, vivia sozinha e sabia se virar, sabia curar com ervas, entendia os animais e cuidava deles, mantinha sozinha a sua terra cultivada, enfim, qualquer atividade contrária que causasse ameaças ao status quo, ao patriarcalismo e a masculinidade, uma demonstração de sabedoria, de conhecimentos e capacidade de gestão, enfim de um nível de independência qualquer era motivo para desconfiança, inveja, medo, mal querência, falação que rapidamente se transformavam em razões para a instalação de um tribunal e julgamento sumários para culpa-las e dar exemplos.
Trazer isto para o Brasil de hoje, como festa é um sinal de banalização que demonstra a disposição de muitos em naturalizar a maldade contra o gênero feminino, sua existência e independência como tal. Tem jeito, cor e tamanho de luta pelo poder – dominação – não se sustenta pela inteligência, pela capacidade mental, por mais que tenha se investido na liberdade sexual e na força de usar o corpo como símbolo da luta pela liberdade.
Guia do Estudante/Julia Ruivo/Reprodução
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