Reeleição – Distorção Democrática.
- fevereiro 13, 2025
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O que deveria ser para o bem social acabou sendo reduzido a uma disputa pessoal. Rimas a parte, carece de renovação.
O que deveria ser para o bem social acabou sendo reduzido a uma disputa pessoal. Rimas a parte, carece de renovação.
São Paulo, 13/02/2025
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A defesa da reeleição como “conquista democrática” carece de solidez quando analisada à luz da experiência histórica brasileira e de princípios republicanos. O caso emblemático da Emenda Constitucional nº 16/1997, que permitiu a reeleição no Brasil, ilustra como a alteração das regras durante o jogo político corrompe a equidade democrática e gera consequências duradouras. Assim, Fernando Henrique Cardoso (FHC), ao promover essa mudança para beneficiar seu próprio projeto de poder, não apenas desestabilizou o sistema, mas também pavimentou o declínio de seu partido, o PSDB, cuja relevância política minguou após seus mandatos.
A ironia é que, enquanto o PSDB usou a reeleição para prolongar seu poder, o partido entrou em declínio posterior, perdendo espaço para forças que criticaram justamente o fisiologismo da era FHC. Ou seja, uma demonstração de que a manipulação das regras gera efeitos colaterais imprevisíveis, corroendo a base de apoio de seus idealizadores.
Reeleição – Distorção Democrática.
Além disso, o argumento de que “o povo queria a reeleição” mascara o medo instrumentalizado da ascensão do PT. FHC justificou a emenda como forma de evitar uma vitória de Lula em 1998, revelando que a mudança foi menos sobre democracia e mais sobre controle oligárquico.
Como alertou o cientista político Juan Linz, sistemas presidencialistas com reeleição tendem a polarizar a política, transformando eleições em plebiscitos pessoais. Assim, acabam incentivando líderes a adotarem medidas populistas para manter popularidade. Nos EUA, citados como exemplo, o limite de dois mandatos foi estabelecido justamente após Franklin Roosevelt eleger-se quatro vezes. Portanto, a reeleição americana foi idealizada e instituída para evitar concentração excessiva de poder, e não o contrário — uma lição que o Brasil ignorou.
Reeleição – Distorção Democrática.
O argumento de que a reeleição garante a realização de projetos de longo prazo não prospera, os projetos são institucionais e não pessoais, e, quando se quiser manter uma determinada ideologia, basta lutar para eleger um correligionário. Ou seja, algo mais lídimo que lutar para eleger a si mesmo sentado na cadeira que aspira.
Na América Latina, a reeleição está associada a crises democráticas, como na Venezuela de Chávez ou na Nicarágua de Ortega. Até mesmo FHC reconhece que o modelo brasileiro falhou em importar a maturidade institucional dos EUA, onde a tradição de alternância é (ou era?) mais arraigada.
Portanto, a solução ideal, como propõe o senador Rodrigo Pacheco, seria adotar um mandato único de cinco anos, sem possibilidade de reeleição. Isso eliminaria o “estado eleitoral permanente” e forçaria os governantes a focarem em legados, não em campanhas. O constitucionalista Celso Bastos, citado no texto original, defende a rotatividade como forma de evitar a “degeneração do poder”.
Reeleição – Distorção Democrática.
Como ensina Norberto Bobbio, a democracia exige regras estáveis que previnam a manipulação por interesses contingentes. A reeleição, no caso brasileiro, tornou-se um mecanismo de perpetuação de elites, não de emancipação popular.
Reeleição como Antítese da República – A experiência brasileira comprova que a reeleição é uma armadilha institucional. Ao permitir que governantes em exercício alterem as regras para se beneficiarem, corrompe-se o princípio da isonomia democrática. O declínio do PSDB pós-FHC simboliza o preço político de tal estratégia. Partidos que apostam em vantagens momentâneas perdem credibilidade a longo prazo.
Como escreveu Mario Sabino, “a ruína causada pela PEC da reeleição é maior do que a de 8 de janeiro”. Restaurar a integridade democrática exige abolir esse mecanismo. Portanto, resgatar o espírito da Constituição de 1988, que originalmente rejeitava a reeleição para evitar o personalismo no poder. A verdadeira conquista democrática não é a permanência de indivíduos, mas a renovação ética das instituições.
José Manoel Ferreira Gonçalves – Pós-doutor em Engenharia, jornalista, escritor e advogado.
Possui destacada trajetória na defesa de áreas cruciais como transporte, sustentabilidade, habitação, educação,
saúde, assistência social, meio ambiente e segurança pública.
Fundador da FerroFrente, iniciativa que visa promover o transporte ferroviário de passageiros no Brasil.
Preside a Associação Água Viva, que fortalece a participação da sociedade civil nas decisões do município de Guarujá.
Membro do Conselho Deliberativo da EngD.