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O Prazer da Submissão

La Boétie é o fundador ignorado da antropologia do homem moderno, do homem das sociedades divididas. Antecipa, a mais de três séculos de distância, o cometimento de um Nietzsche (mais ainda que o de um Marx), que consiste em pensar a degradação e a alienação. (Pierre Clastres

Há quase 500 anos, Étienne de La Boétie escreveu um ensaio (“O Discurso da Servidão Voluntária”) em que analisa as razões da submissão (relação “dominação-servidão“), um tema que vai da filosofia política a psicanálise.

La Boétie quis entender porque as pessoas se submetem a um tirano e ele entende que a servidão não é imposta pela força, mas aceita de forma voluntária. Se assim não fosse, argumentou, como seria possível conceber que um pequeno número de pessoas pudesse obrigar todos os outros cidadãos a obedecer de forma tão servil a único tirano? Desta forma, para ele o estado natural deveria ser a revolta, o tempo todo.

o prazer da submissão
O prazer da submissão foi abordado por estes três grandes pensadores. Mas, Aristóteles já havia feito as suas observações. (Img. Web)

Mais tarde, Espinosa reformula essa questão. Para ele a servidão voluntária se dá quando as pessoas estão tomadas por paixões tristes, sobretudo medo. É aí onde surge o tirano, que consegue explorar o ressentimento das pessoas.


De acordo com Reich: A supressão da sexualidade natural da criança, torna a criança apreensiva, tímida, obediente, com medo da autoridade, boa e ajustada no sentido autoritário. Paralisa as forças rebeldes porque qualquer rebelião é carregada de ansiedade. Em resumo, o objetivo da supressão sexual é o de produzir um indivíduo que se ajuste à ordem autoritária e que se submeta a ela, apesar de toda miséria e degradação.

É exatamente isso que é explorado no maravilhoso filme de Michael Haneke, A Fita Branca, que mostra uma aldeia alemã, às vésperas da I Guerra, como criadouro do nazismo, o “ninho da serpente“.

Assim, o padrão libidinal do fascismo é despertar no sujeito sua herança arcaica que também o tornara submisso ao pai, ao “Pai Primordial”, ao “deus-pai”, o pai que ama e pune ao mesmo tempo, uma relação sadomasoquista que gera uma paixão extrema pela autoridade; nas palavras de Le Bom: as massas tem sede de obediência. E devem essa obediência a qualquer um que seja o arquétipo de “pai”.

Pai Patrão

Sabe o que é mais impressionante? É que a dinâmica de domínio-submissão não ocorre apenas no plano coletivo. É uma relação superegóica individual: adestrados desde a infância sob o poder concentrado de nossos pais, somos levados, individualmente ao jogo de domínio-submissão em graus variados.

Portanto, esses jogos podem ser tão inofensivos como uma brincadeira amorosa na cama, ou a adesão viciosa a tiranias políticas em que somos, ora passivos, ora ativos, submissos ao tirano e tiranos uns com os outros, inclusive tiranos de nós mesmos.

Samuel Fernando – AI Engineer | Generative AI | MSc Quantum Computing at USP

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Redação

ÆscolaLegal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve, com foco crescente em Educação 4.0 e além, Tecnologia/Inovação, Sustentabilidade, Ciências e Cultura Sistêmica. Publisher: Volmer Silva do Rêgo - MTb16640-85 SP - ABI 2264/SP

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