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Aprender Desaprender e Reaprender – XXI

Educação e Tecnologia: uma relação antiga – A espécie humana sempre foi muito hábil em procurar e encontrar soluções para os mais diversos problemas que lhe foram apresentados.

Max Damas

São Paulo, 05/04 de 2021.

3 Minutos

Nosso aparato físico, biológico e mental desenvolveu-se na mesma medida que éramos expostos aos novos desafios. Vem dessa construção dinâmica, regular e permanente a nossa habilidade em criar soluções para os problemas complexos que a evolução nos impôs.

Para cada novo problema, incorremos ao uso de inúmeras tecnologias (técnicas e procedimentos), concebidas no momento exato para garantir a sobrevivência da espécie humana. Para cada nova tecnologia criada, tornava-se necessário criar uma forma para assegurar que aquele conhecimento, pudesse ser comunicado aos membros da sua comunidade, aperfeiçoando assim a construção da linguagem. (BERWICK e CHOMSKY, 2017).

Tendo a linguagem como base, inicia-se o desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação (TIC), que ampliaram, e muito, as interações e conexões entre os indivíduos, construindo padrões de relacionamentos, hábitos e comportamentos que deram origem à cultura de uma civilização.

Pela necessidade de preservação e evolução de cada sociedade, começamos uma relação recorrente de ensinar e aprender mediados pelas TICs. Em paralelo, o processo educacional começa a se organizar num formato de método, aquisição e transmissão de saberes, habilidades e experiências sistematizadas dentro do contexto histórico, social e econômico de cada época.

Evolução – Sapiens é só um estágio! (Img: Internet)

Pela perspectiva da tecnologia, também mudamos o nosso olhar em relação a nós mesmos e ao que nos cerca. Isso perdura até hoje, mesmo mudando as tecnologias e os meios, mas sempre na busca pela solução de problemas, com base em ações transformadoras e inovadoras, que são ou deveriam ser os objetivos de qualquer processo educacional. Iniciamos uma busca permanente em encontrar meios para que a informação flua com maior rapidez, eficiência e clareza.

A 4ª Revolução Industrial e o papel da Educação. Mas, e o papel do Estado?

Fazendo um recorte no tempo para o nosso atual momento, temos no início do século XX a 3ª Revolução Industrial, com aumento crescente da automatização dos meios de produção. A partir dos anos 1990, com o uso crescente dos computadores, a informação passa a ser armazenada, processada e transportada por meios digitais.

A 3ª Revolução Industrial chega ao seu fim na primeira década do século XXI com a digitalização em massa dos processos automatizados, culminando na atual 4ª Revolução Industrial, caracterizada não por um conjunto de tecnologias em si, mas pela série de processos decorrentes e inter-relacionados da combinação das tecnologias advindas da digitalização crescente e massiva intermediadas pela internet e pelas plataformas digitais. (SCHWAB, 2016).

Em paralelo à 4ª Revolução Industrial temos o mundo VUCA (Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo).* Nesse contexto, o uso massivo das tecnologias digitais, permitiu o surgimento de novos modelos para os relacionamentos pessoais, sociais, culturais e econômicos decorrentes das possibilidades que a internet e os novos meios de comunicação proporcionam. A partir dessas novas relações surgem novos significados: sobre quem somos, o que gostamos e como nos relacionamos com tudo o que nos cerca. Sob essa perspectiva, a Educação não deve ficar de fora do debate sendo uma área da atuação e conhecimento transversal a todas as demais áreas.

As habilidades do mundo VUCA*: conciliando tecnologia e escola
Educar para o trabalho - a espécie vai avançar mais ainda.
Educar para o trabalho – a espécie vai avançar mais ainda. (Img. Internet)

Sendo a Educação um ‘espaço’ no qual ocorrem inúmeras interações entre seus atores (estudantes, professores, gestores e sociedade), é natural que as informações e experiências oriundas dessas interações sejam mediadas, utilizadas e potencializadas pelas tecnologias digitais, fazendo da Educação um solo fértil para as inovações advindas do mundo VUCA.

Nesse novo ambiente a memorização de conteúdos tem cada vez menos importância, dada a facilidade de acesso à informação de qualquer lugar a qualquer momento. Os professores não detêm mais o domínio irrestrito do conteúdo. O fluxo das informações, antes centralizado e unidirecional, passa a ser descentralizado e multidirecional. O professor não é mais o único ponto de contato do estudante com o conteúdo.

Torna-se imperativo que as escolas criem currículos, ambientes e projetos pedagógicos focados não apenas no aprender a aprender, mas que tenham o papel de impulsionarem a elaboração de novas possibilidades de aprendizado: desaprendendo e reaprendendo. É fundamental que todos os atores estejam dispostos a construir uma nova forma de chegar ao conhecimento em conjunto.

Eis aí o objeto de estudo da complexidade: encontrar soluções dentro da diversidade de saberes. Já a ambiguidade, reforça que no processo educativo o que funcionou bem para um estudante ou grupo de estudantes, não necessariamente funcionará num outro contexto (a diversidade e multidisciplinaridade são expressões marcantes do mundo VUCA*). Por fim, a volatilidade vem lembrar que o que era uma estratégia ou processos vencedores, podem rapidamente tornarem-se desatualizados e sem sentido.

Cada vez mais o processo de aprendizagem deve-se dar pela conexão colaborativa de conhecimentos e pela solução de problemas para as realidades vivenciadas por cada indivíduo: o exercício da criatividade, envolvendo pessoas e intermediadas pelas tecnologias digitais. Essa dinâmica permite testar e validar rapidamente novos processos e estratégias pedagógicas, transformando as escolas em espaços motivadores para inovação e engajamento.

O que é, o que era e o que será? O ‘mundo’ sempre será o mesmo?
Já estamos no Home Office . Mas, só para alguns.
Já estamos no Home Office . Mas, só para alguns (Img Internet)

Por mais que possa parecer contraditório, quanto mais falarmos das tecnologias digitais e do mundo VUCA, mais acabamos destacando as habilidades perenes e indissociáveis da natureza humana, tais como a criatividade, comunicação, colaboração e pensamento crítico, conhecidos na literatura como as habilidades dos 4 C´s, discutidos na obra da pedagoga Cathy Davidson, “The new education: How to revolutionize the university to prepare students for a world in flux” e citadas pelo escritor israelense Yuval Harari, na sua obra21 lições para o Século XXI”.

Harari dedica-se nessa obra a analisar numa perspectiva futura o que manterá a relevância do ser humano daqui em diante. Num capítulo especial sobre Educação ele pondera que o que deve ser elaborado no ambiente escolar é a capacidade de combinar os múltiplos fragmentos de informação em algo contextualizado na realidade do mundo. A informação será abundante, mas o que faremos com ela e como construiremos a nossa narrativa será o diferencial para a evolução da sociedade e de cada um dos seus indivíduos.

A formação dos estudantes precisa considerar a construção de habilidades específicas para lidar com a informação, principalmente, para a geração de novos conhecimentos. Assim, podemos entender que a educação do mundo VUCA* não deve limitar-se ao treinamento para o uso das tecnologias de informação e comunicação. O mais importante é dedicar os nossos esforços na criação de habilidades que permitam aos estudantes a fluência digital, a produção de conhecimento, o trabalho colaborativo, o pensamento crítico e a capacidade de aplicá-los criativamente, desde usos simples até situações mais sofisticadas.

As TICs são cada vez mais digitais, tendo a facilidade de se adaptarem aos mais diversos meios. As escolas são um dos espaços – ou meios – onde a comunicação do processo educacional ocorre. No mundo VUCA, esses três itens devem ser revisitados: o meio, o professor e o estudante.

As tecnologias digitais são um meio, não um fim

São inúmeros os motivos pelas quais as tecnologias digitais devem estar presentes no dia a dia das escolas. No entanto, devemos estar atentos à alfabetização e ao letramento digital, de forma a materializar a acessibilidade das tecnologias e das informações minimizando a exclusão digital. Cada vez mais a inclusão digital deve garantir aos indivíduos mais do que buscar a informação, mas que possam obter conhecimento.

Se o futuro é VUCA ou um passo além o que nos garante um mundo para todos?
Se o futuro é VUCA ou um passo além o que nos garante um mundo para todos? (Img Internet)

Trazemos então o olhar para o letramento digital, que se caracteriza em disponibilizar alternativas para a apreensão da linguagem digital e a consequente habilidade na construção de novos sentidos e significados, através das tecnologias digitais. O letramento digital é peça fundamental na constituição da cidadania e da formação do ser humano.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), de 2018, nos apresenta a necessidade do desenvolvimento de competências e habilidades relacionadas ao uso crítico e responsável das tecnologias digitais tanto através da transversalidade, quanto de forma direcionada. E este direcionamento tem como fim o desenvolvimento de competências relacionadas ao próprio uso das tecnologias, recursos e linguagens digitais, isto é, para o desenvolvimento de competências de compreensão, uso e criação de ferramentas digitais em diversas práticas sociais, como bem destacada na competência geral da BNCC.

A escola deve compreender que o uso das tecnologias digitais não é apenas porque elas fazem parte do cotidiano dos indivíduos como ferramentas de interação e entretenimento, mas sim, e principalmente, porque pode auxiliar enormemente no desenvolvimento e aprendizagem dos estudantes. Lembrando sempre que dentro da complexa estrutura social, as escolas são agentes de transformação social e econômica pelo menos desde o meio do século XIX, na 2ª Revolução Industrial, onde a relação Escola, Estado e meios de produção entraram em acordo para produzirem indivíduos uteis e preparados para produzirem e consumirem os produtos da nova classe industrial dominante.

Ao refletirmos sobre o processo pedagógico mediado pelas tecnologias digitais, não devemos nunca desconsiderar que o objeto da ação deve estar na posição exata entre os sujeitos (estudantes e professores) e não direcionado na técnica. É urgente repensar os projetos pedagógicos com o olhar cuidadoso em não supervalorizar o poder das tecnologias digitais, pois não cabe exclusivamente a elas a garantia de qualidade da educação.

O que deve ser avaliado e considerado no projeto pedagógico de cada escola não é qual tecnologia digital utilizar, mas sim qual o propósito e objetivo de aprendizagem.

Max Damas – Dr. Engenharia de Produção

Bibliografia

BERWICK, R. e CHOMSKY, N. Por que apenas nós? Linguagem e evolução, 1a edição. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2017.

DAVIDSON, C. N. The new education: How to revolutionize the university to prepare students for a world in flux. 1ª edição. Nova York: Basic Books, 2017.

HARARI, Y. N. 21 lições para o século XXI. 1ª edição. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2018.SCHWAB, K. A quarta revolução industrial, 1a edição. São Paulo: Editora Edipro, 2016.

SCHWAB, K. A quarta revolução industrial, 1a edição. São Paulo: Editora Edipro, 2016.

[N.E.: *VUCA: termo utilizado pelos militares norte-americanos, desenvolvido no Pentágono, para designar cenários possíveis de guerra. O soldados eram preparados para atuar nas condições que a sigla designa como sendo a realidade em torno num provável ambiente de extrema hostilidade de ações bélicas contra qualquer tipo de inimigo, a qualquer tempo e em qualquer lugar.]

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Redação

ÆscolaLegal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve, com foco crescente em Educação 4.0 e além, Tecnologia/Inovação, Sustentabilidade, Ciências e Cultura Sistêmica. Publisher: Volmer Silva do Rêgo - MTb16640-85 SP - ABI 2264/SP

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