Educadores

PRÁTICAS RESTAURATIVAS NAS ESCOLAS

Os Círculos como proposta de um novo olhar nas relações escolares.

Instituto THEM

São Paulo, 25/08 de 2020

3 Minutos

A convivência escolar é marcada por uma grande complexidade trazida pela continuidade de múltiplas e diversificadas relações entre os atores: alunos, professores, equipes técnicas, de apoio, pais e comunidade. Este complexo requer, comumente, as práticas restaurativas na escola.

Em um cenário onde se encontram cotidianamente crianças, jovens e adultos, cada um deles trazendo para a dimensão do coletivo suas individualidades, há que se pensar em uma rede de relações muito rica e complexa, ambiente fértil para a ocorrência de conflitos.

Os alunos em suas diferenças, quer sejam tímidos, introspectivos, os que vivem mais isolados e sofrem bullying, ou os extrovertidos, agressivos, os que praticam o bullying vão encontrando maneiras de se colocar no grupo e responder às demandas relacionais.

Neste processo, os jovens e crianças tendem a se agrupar e se fechar de acordo com seus interesses, criando muitas vezes um ambiente de disputa em que conflitos e violência têm marcado presença.

Alunos brigam dentro e fora da escola, muitas vezes sem ter clareza do que ocasionou a situação e sem pensar na possibilidade de uma alternativa para resolver as disputas e conter a violência.

A escola responde a estas situações com os recursos possíveis.

Por não ter uma postura cultural de envolver os alunos ativamente nas questões, muitas vezes a escola atua sem se dar conta de que também comete agressões e violência, ainda que implicitamente, com reflexos negativos para seus alunos nos aspectos emocionais, sociais, psicológicos e educacionais.

Na sociedade em geral, se assiste a um aumento de ações baseadas nas práticas restaurativas que segundo Wachtel (2015), tem o objetivo de desenvolver uma comunidade e manejar o conflito e as situações reparando os danos e recuperando relações.

Entretanto, a escola tem tratado das situações de conflitos e violência ainda de forma punitiva, sem que crianças e jovens se responsabilizem por suas ações e se envolvam na busca de soluções alternativas.

No ambiente escolar a convivência se posta então como a disciplina mais complexa. Aprender a conviver, compreender as diferenças, conversar e discutir sobre a violência velada ou explicita, buscar formas de soluções compartilhadas para os conflitos são, portanto, os principais desafios da ação educacional.

Todos precisam de ajuda no exercício de conviver! Todos podem se beneficiar com a mudança de olhar e com a escuta diferenciada.

Uma escuta sem julgamento prévio, buscando entender e ou atender às necessidades individuais.

Belinda Hopkins (2011) preconiza a construção de uma escola onde as pessoas cuidam umas das outras e onde há bons relacionamentos, respeito mútuo e um sentido de pertencimento que são a chave de um aprender e de um ensinar bem sucedido.

Assim, o Instituto THEM vem desenvolvendo projetos de implementação de Práticas Restaurativas nas escolas apoiado na representação filosófica de que valores compartilhados são alicerces que darão sustentação às relações.

Acreditamos serem estes projetos possibilidades de trazer a mudança de paradigma no ambiente escolar, humanizando as relações. Desta forma, o Instituto THEM propõe para a comunidade escolar a utilização da metodologia Círculo.

O Instituto promove aulas e cursos de capacitação em Mediação de Conflitos e Práticas Restaurativas

O Círculo é um formato conversacional e tem como um dos objetivos construir relações harmoniosas, em que o consenso e as decisões sobre situações relevantes ao grupo são o foco principal.

Porém, lembrando que consenso não é todos concordarem com uma só ideia ou ação, mas sim chegar a melhor solução em prol da comunidade.

De acordo com Pranis (2019) os Círculos são representações dos costumes dos povos tradicionais das Américas e da nova Zelândia e existem vários tipos de Círculos.

Pequenos e grandes problemas

Eles podem relacionados a diferentes propósitos e motivações: podem ser utilizados para conversar e/ou tomar decisões sobre um tema de interesse de todos, para planejar um evento, para resolver pequenos ou grandes conflitos.

É uma metodologia baseada nos nossos ancestrais quando se reuniam em volta de uma fogueira para conversar e resolver problemas.

Usavam o ‘Cachimbo da Paz’ como “peça de fala”, ou seja, quem estivesse com o cachimbo na mão tinha a vez da fala enquanto os demais escutavam.    

O mesmo aconteceu durante muito tempo com as famílias ao se reunirem em torno da mesa para conversarem e resolver problemas. Resumidamente, é desta forma que acontece o Círculo e na escola o uso desta metodologia tem uma dimensão peculiar.

Sentar-se em círculo na sala de aula transcende a ideia do formato geométrico. A disposição do Círculo nos permite pensar na horizontalidade das relações, quando todos têm vez e voz para falar.

A possibilidade de olhar nos olhos e não na nuca dos colegas pode promover uma aproximação maior, a conexão vai se formando à medida que os alunos e professores têm a oportunidade de se conhecerem, às histórias dos colegas e seus sentimentos e suas emoções.

Os valores, escolhidos pelo grupo, em geral incluem respeito, tolerância, compreensão, não julgamento, empatia, amizade, solidariedade, honestidade, transparência, humildade, amor, conexão.

A participação de todos, o engajamento na construção dessa prática estreita relações e empodera os participantes.

A adoção da metodologia Círculo na comunidade escolar está sujeita a algumas diretrizes e estratégias. Num primeiro momento devem ser respeitados os princípios de Inclusão e Voluntariedade, ou seja, deve estar aberto a todos os envolvidos, sem exclusão, e ter a adesão voluntária de todos. 

Preparando o espaço adequado

Há necessidade de um local apropriado com o número de cadeiras iguais ao número de participantes e um facilitador preparado para esta função.

Essa preparação envolve estudo da fundamentação teórica sobre o papel do faciitador além de uma escuta genuína e de respeito por todos os participantes. Wachtel (2015) identifica dois tipos de enfoques na metodologia: os Círculos Proativos e os Reativos.

Os Círculos Proativos, também chamados Círculos de Construção de Comunidade têm como proposta a construção de um ambiente seguro e harmônico. Podem ser de celebração, apoio, compreensão, construção do senso comunitário, Diálogo.

Os Círculos Reativos, por sua vez são utilizados em situações de conflitos que precisam ser resolvidas, como por exemplo, divergência de opinião entre colegas.

Também nas questões entre direção e funcionários e entre vários com ações de suporte, reintegração, resolução de conflitos,  sentenciamento.  

O início da implementação dos Círculos é também o início do estabelecimento de relação de confiança. A habilidade do facilitador preparado atua na construção desta confiança e favorece o estreitamento da relação.

A participação de todos na construção é fundamental, cada participante vai perceber a importância e o valor do seu papel além do que que quando existe um problema na comunidade escolar, todos, de forma sistêmica são afetados.

Na realização do Círculo existe um fluxo característico que se constitui das seguintes fases:

  1. Preparação: observação da situação, do histórico da violência, da voluntariedade dos participantes, da segurança e da escolha do facilitador
  2. Acolhimento: ação para ajudar as pessoas a se colocarem no espaço do círculo.
  3. Abertura: o Círculo, por sua natureza deve iniciar com um momento em que todos os participantes têm a chance de manifestar seus sentimentos, necessidades e expectativas.
  4. Construção de valores para a convivência (Regras de funcionamento): neste momento os participantes devem formular os combinados sobre como o Círculo funcionará. 
  5.  Círculo: Desenvolvimento do círculo, conforme o propósito desejado.
  6. Fechamento: momento em que as pessoas compartilham no final do círculo, sentimentos, aprendizados e como estão saindo do encontro.

Escolas preparadas

Observa-se que gradualmente, as escolas vêm aderindo à implementação das Práticas Restaurativas e da metodologia Círculo.

As escolas que já estão neste caminho, nos trazem depoimentos promissores desde o comportamento dos alunos com participação e engajamento de todos em questões diversas, até melhora no desenvolvimento da aprendizagem.

Mas, também se convive com certa resistência de outras escolas à implementação dessa nova metodologia sob a alegação de que essa prática dificultaria o desenvolvimento do plano de trabalho para o ano letivo.

No entanto, percebe-se que essa prática contribui para diminuição de problemas disciplinares e para a melhora nos relacionamentos ao criar ambientes mais produtivo.

Propor a metodologia de Círculo na escola representa trazer mais um recurso para o âmbito educacional, com base na humanização das relações, na mudança de olhar para o conflito e violência, sob o prisma das práticas restaurativas.

Por fim, indica envolver toda a comunidade escolar na busca do atendimento das suas necessidades e na responsabilização de seus problemas.

Instituto THEM

Bibliografia: COSTELLO, B. WACHTEL J. e WACHTEL T. Círculos Restaurativos nas escolas. Pensilvania, EUA: IIRP, 2011.

FANTE, C. Fenômeno Bullying. Como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. São Paulo: Versus, 2005.                                                 

GRECCO, A. e outros.  Justiça Restaurativa em Ação: Práticas e reflexões. São Paulo: Dash Editora, 2014.                               

HOPKINS, B. Práticas Restaurativas em Sala de Aula – usando abordagens restaurativas para promover aprendizado eficaz. In Transforming Conflicts, 2011 (traduzido pela equipe Justiça em Círculo, 2014);

MEIRELLES, C. A. Práticas Restaurativas nas Escolas. In PELIZZOLI E SAYÃO (orgs). Diálogo, Mediação e Justiça Restaurativa. Recife: Ed UFPE,2012.  

PRANIS, K. Processos Circulares. São Paulo: Palas Athenas,2019.

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Redação

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