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Educação e Tecnologia: privilégios antes e durante a quarentena

É fato que a tecnologia e o acesso às suas ferramentas se tornaram necessidades nessa nova realidade imposta pela quarentena

Andressa Alves

3 Minutos

A quarentena provocada pelo covid-19 fez com que a tecnologia ganhasse mais espaço na vida da população e se tornasse uma importante ferramenta para lidar e adaptar as necessidades impostas pelo isolamento. Na educação, a tecnologia passou de alternativa para se tornar a principal maneira de cumprir a grade curricular por meio de aulas, atividades e avaliações virtuais.

Em muitas escolas as aulas são agora ministradas por whatsapp, e-mail e chamadas de vídeo. Cada instituição de ensino está experimentando diferentes maneiras para encontrar a plataforma mais adequada e o melhor jeito de aproveitar as ferramentas disponíveis para que a comunicação entre professor e aluno seja eficaz e aula, proveitosa. São muitos os desafios e a maioria deles evidencia as diferenças entre os ensinos particulares e públicos.

Não é novidade que sempre existiu uma grande distância entre as escolas públicas e privadas. A diferença entre elas é a causa e a consequência da desigualdade existente. “Agora a sociedade está conseguindo enxergar o quanto que essa desigualdade é grande e o quanto de problemas e mais desigualdades, em relação à falta de acesso e à falta de equidade, provoca na vida dos estudantes”, aponta a educadora e escritora Janine Rodrigues.

Nesse contexto, a sociedade conscientiza-se que não basta ter acesso a equipamentos e acesso a internet. É preciso também saber usar as ferramentas disponíveis. O ensino à distância também exige que o aluno tenha certa autonomia para cumprir as exigências das aulas virtuais. Mas essa realidade não está disponível para todos os estudantes de maneira igualitária.

Segunda leitura

Maira Conde é professora e coordenadora de uma escola estadual no bairro Jardim Ângela, zona sul de São Paulo, e descreve como estão sendo as aulas durante a quarentena: “Embora eu tenha certa autonomia no uso de tecnologias, a dinâmica de aulas online é muito diferente do ensino presencial. Muitos alunos acharam que as aulas online seriam no ritmo de cursinhos como o Descomplica. Eu não gosto dessa dinâmica. Gosto do dialógico, mas sem a música, a dança e os outros elementos comuns a esse tipo de aula. Nesse sentido, tenho procurado utilizar recursos tecnológicos como o Google Sala de Aula, slides e sugestões de canais da área de ciências humanas.

Mas, nem todos os professores têm fácil acesso aos equipamentos e ferramentas digitais. “Felizmente, eu tenho um notebook e wi-fi em casa, mas é importante lembrar que boa parte do quadro de magistério não tem. Outra questão fundamental é que eu tenho uma maior autonomia no uso de tecnologias e essa também não é a realidade de boa parte do quadro de professores da rede”, aponta a Maira.

Em outro ponto na capital paulista, Jaqueline Pinto de Carvalho prepara as aulas de inglês para ministrar aos alunos do ensino infantil ao médio de uma escola particular na Casa Verde, região da Zona Norte da cidade.  Com o apoio de ferramentas como Google for Education e o Google Sala de Aula, Jaqueline conta que as aulas estão sendo todas gravadas e disponibilizadas para os alunos. “Fomos pegos de surpresa. É uma nova realidade que nós não esperávamos que a pandemia trouxesse. Muitos professores estão tendo jornadas duplas e até triplas, dependendo da carga horária, para preparar e gravar as aulas.

Nós ficamos por muito tempo usando a tecnologia como suporte para levar algo diferente para a sala de aula. Agora estamos tendo que incorporar esses recursos para poder dar aula”, destaca Jaqueline ao analisar a nova rotina em que professores e alunos de São Paulo estão vivendo desde 24 de março (data que o Governo decretou o início da quarentena).

Quarentena e reaprendizado

A cultura digital vai além do fácil acesso aos equipamentos e sinal de internet. É preciso que exista o hábito de utilizar as ferramentas e saber aproveitá-las no dia a dia. “Existe um número imenso de profissionais formados que a gente não discute a sua capacidade intelectual, mas que não têm o hábito de usar algumas ferramentas digitais. Muitas pessoas, por exemplo, não sabem usar o Google Agenda, o Google Drive. Às vezes, o professor tem que mandar um arquivo para o aluno e não sabe mandar. E a gente não pode culpar um ou outro determinado grupo. Isso tem a ver com uso, com hábito e com incentivo de utilizar esses recursos”, explica a educadora Janine.

Neste momento de quarentena, a tecnologia tem sido o principal meio de solucionar as necessidades de acesso aos serviços e consumo em diferentes setores. Realizar as compras de mercado, pagar contas, trabalhar e estudar. Computadores, notebooks e celulares com acesso a internet facilitam o isolamento físico, ao mesmo tempo em que ‘impede’ o distanciamento social desde que todos estejam conectados.

Mas, o que acontece quando nem todos podem estar conectados? Maira Conde fala que na escola em que trabalha, mais de 60% dos alunos possuem smartphone, porém ter um telefone em mãos não é garantia de acesso ao conteúdo das aulas.  “Isso depende de ter acesso à rede de internet e de outros fatores mais subjetivos. Existem estudantes que não se adaptam ao ensino mediado por tecnologia, porque são alunos com menos autonomia ou com defasagens tão gritantes que dependem de um acompanhamento sistemático dos professores.”

Jaqueline também fala como ambiente fora da escola também é determinante para que o aluno se adapte à nova realidade. “É importante saber como os alunos estão sendo orientados em casa em questão de rotina. Uma vez que a sala de aula agora está em casa e eles precisam se programar em como fazer as atividades e não se perderem e atrasar o que precisa ser feito. É muito importante que exista a parceria coordenação, professores e alunos para acompanhar se os alunos estão tendo o aproveitamento adequado.

A educação não pode ser tratada como um privilégio. Tem que ser tratada como um direito. Se existe o benefício para um, esse benefício tem que ser para todos. Se um grupo tem acesso a determinada ferramenta e, por isso, está a ‘um passo a frente’, não podemos considerar que esse ‘passo a frente’ foi simplesmente por uma meritocracia, porque não foi”, explica Janine.

Andressa Alves – Jornalista

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Redação

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One thought on “Educação e Tecnologia: privilégios antes e durante a quarentena

  • Rita J Leira Aires

    Uma doença causada por um vírus (um “indivíduo” minúsculo) foi suficiente para expor as enormes desigualdades do Brasil… Um país com alguns bilionários do ranking mundial, mas cujos 85% da população não acesso aos esgotos, outro tanto não tem água potável, e toda a sujeira e dejetos que as pessoas nas grandes cidades produzem sãos despejadas nos rios, um crime contra a natureza e contra si mesmas, porque todos precisam de água para viver…Vergonhoso!

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