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Smart City: a Cidade Inteligente

O desafio de compartilhar o conhecimento

Falar de tecnologia digital é fascinante para muitos, assustador para outros. Escrevo esse artigo para ambos, fascinados e assustados. Nós todos estamos no meio de mais uma grande transformação tecnológica em que precisamos nos capacitar e adaptar, para não ficarmos para trás na Smart Cit: a cidade inteligente.

Jorge Barros

São Paulo, 30/04 de 2020.

2 Minutos

A missão do pesquisador-educador é compartilhar conhecimento útil, orientar soluções que melhorem o bem estar das pessoas, trazer à luz a compreensão dos fenômenos sociais e impulsionar a transformação da ciência em tecnologias que sirvam para melhorar o mundo em que vivemos.

Nesse sentido, para que o conteúdo dos artigos não-acadêmicos que escrevo possa chegar a todos, costumo começar pedindo um Disclaim, que é um termo em inglês que significa que aqui eu não terei preocupação com os rigores acadêmicos dos artigos científicos, nem com a tecnicidade do linguajar que é próprio dos especialistas nesse assunto.

Quando falamos de tecnologia de Cidades Inteligentes para um público não-especializado, é fundamental traduzirmos de forma mais simples possível os conceitos complexos que dificultam o entendimento para a maioria das pessoas. Quanto mais pessoas, especialistas e não-especialistas, entenderem como a tecnologia afeta seus cotidianos, maior será a participação efetiva desses cidadãos nas decisões sobre políticas públicas. Consequentemente, melhores serão os serviços prestados pela gestão municipal da cidade onde vivem.

As confusões conceituais sobre o termo Cidade Inteligente

Inicialmente é importante desfazermos algumas confusões que foram provocadas pelas várias definições que estudiosos deram ao termo em epígrafe. Depois de uma rápida pesquisa que fiz entre 250 especialistas mundiais no assunto, não encontrei dois autores que concordassem com uma mesma definição sobre o que é uma Cidade Inteligente.

Mas há uma explicação para isso. É que no passado recente houve dois momentos, um de tradução e outro de interpretação, que contribuíram para divergir opiniões e para largamente embaraçar esse conceito. 

A primeira explicação dessas divergências é que na década de 1990, para facilitar a escrita e a pronúncia, o termo Intelligent City foi mudado para Smart City no idioma inglês. Smart em inglês também significa “Inteligente” nas línguas latinas, onde esse adjetivo tem uma conotação que indica “capacidade de entender”.

Entretanto, o sentido de “Inteligente” no campo tecnológico, militar e político é outro. No caso do termo Intelligent City, a palavra Intelligent foi etimologicamente definida para demonstrar a “Qualidade de interligar funções, conectar dados para produzir informação e unir informações para tomada de decisões”. A sutileza dessa tradução tão próxima, porém equivocada, deu margem a uma série de interpretações erradas sobre o que seria uma cidade “Inteligente”.

Por incrível que possa parecer, guerras no mundo foram deflagradas por falhas de tradução, enormes conflitos e crises entre países também. E eis aqui um exemplo de mais um equívoco que poderia ter sido evitado, caso à época tivessem atentado para a sutileza da tradução daquela palavra.

Portanto, uma Cidade Inteligente deve ser também, mas não significa necessariamente uma cidade que é “sabida”, “esperta” ou onde as coisas funcionam a partir de serviços prestados com “alta capacidade de entender”. Cidade Inteligente é precipuamente uma cidade onde aquelas soluções que são aplicadas para atender as necessidades dos cidadãos estão interoperáveis e produzem ganhos adicionais de eficiência, de economicidade e de continuidade pela conectividade que as une.

Onde, quando e como surgiu o termo Cidade Inteligente? O primeiro registro do termo Cidade Inteligente encontrado na literatura é uma referência à cidade de Amsterdam, no início dos anos 90. Essa referência foi feita a um projeto que utilizava a informática para interligar diversos serviços públicos da cidade naquela época. Os administradores municipais da capital da Holanda tiveram a visão que não seria suficiente dotar o município de soluções tecnológicas modernas e informatizadas, se essas não estivessem conectadas a uma plataforma que as unisse para produzir ganhos adicionais. 

A conectividade que produz ganhos adicionais

Naquela época, com seu Plano Integrado de Informática, a cidade de Amsterdam entendeu que os novos serviços informatizados ao cidadão precisavam estar operacionalmente interligados para poderem produzir os seguintes ganhos adicionais:

1)  Economia de escala na compra dos softwares e hardwares;

2) Aumento da eficiência dos serviços públicos prestados pela gestão municipal como um todo e;

3) Garantia de poder atualizar as tecnologias instaladas, em vista de suas inexoráveis obsolescências, sem a necessidade de descarta-las.

Do antigo CPD à Internet das Coisas          

Uma boa forma de entendermos o que a cidade de Amsterdam vislumbrou e aplicou em termos da importância da interoperabilidade entre as diversas soluções digitais, é olharmos para a transformação tecnológica da nossa história recente. 

Saímos da Era Industrial e estamos hoje no que os estudiosos chamam de “A Era da Informação”. Desde a década de 70 do século passado, o mundo testemunhou um avanço vertiginoso das tecnologias da informação e da comunicação, assim como de outras tantas tecnologias que têm fundamento no microprocessamento digital de dados.

Passamos pelo tempo do Processamento de Dados, da Informatização, da Digitalização e agora entramos num novo tempo: o tempo das Soluções Digitais Inteligentes, portanto de soluções convergentes, integradas, interoperáveis. 

Nesse campo de estudo das Soluções Digitais Inteligentes, uma das novidades tecnológicas mais importantes, e ainda pouco difundida, é conhecida como I.o.T – Internet of Things (pronuncia-se “Aiôtí”) e que em inglês significa “Internet das Coisas”.

IoT pode ser explicada da seguinte forma: nos últimos 40 anos, vimos gente conversando com gente pelo telefone, por fax, por telecomunicação celular e por email; vimos também gente conversando com coisas e coisas conversando com gente, através dos comandos de um computador e de outros equipamentos microprocessados.

O que vamos ver agora são coisas conversando com coisas, através da comunicação entre equipamentos digitais interoperáveis. “Coisas conversando com coisas” é o que chamamos de Internet of Things – IoT, em nossa língua, Internet das Coisas. Vamos exemplificar:

a) Um sistema de emergência de saúde pública conectado a um sistema de controle de mobilidade urbana, permite que no momento que o motorista da ambulância ligue a sirene, um chip desse veículo envie um sinal digital para sensores instalados na rede de iluminação das ruas, “conversando” com os semáforos, de forma a permitir a passagem rápida da ambulância, ininterrupta e sem paradas, até o seu destino final. 

b) Um sensor de proximidade e saturação instalado num container de lixo estacionário de rua vai “conversar” com um sensor de rota instalado num caminhão de recolha, permitindo que o veículo receba essa informação em tempo real e evite se dirigir às ruas onde esses depósitos ainda não estão cheios, economizando combustível, evitando a poluição do ar, poluição sonora, e melhorando o excesso de tráfego de veículos pesados em vias de grande movimento. 

Esses são dois exemplos bem simples de soluções digitais interoperáveis que produzem melhor qualidade de vida para o cidadão e, portanto, transformam uma cidade naquilo que chamamos de uma Cidade Inteligente. 

A Interoperabilidade: o principal fator de uma solução digital inteligente

Percebemos a partir dos exemplos acima mencionados que, se não houver interoperabilidade entre os sistemas, podemos até ter uma cidade totalmente digital, mas não teremos necessariamente uma Cidade Inteligente.

A maioria das cidades modernas hoje contam com soluções digitais que frequentemente são apenas silos tecnológicos estanques, isolados, não conectados. São tecnologias de última geração, mas que isoladamente pouco contribuem para produzir melhores serviços ao cidadão. 

A partir das definições e da análise dos exemplos acima sobre o que faz uma cidade ser inteligente, chegamos facilmente à conclusão sobre o que realmente fundamenta esse conceito e o que diferencia uma solução puramente digital de uma solução inteligente: a Interoperabilidade Tecnológica.

Interoperabilidade Tecnológica é, portanto, um ambiente onde diversas soluções digitais produzem uma ganho adicional pela conectividade que as une, adicionalmente às valias intrínsecas das suas próprias configurações.

O planejamento integrado e a participação dos cidadãos

É necessário que continuamente congreguemos formuladores de políticas públicas, representantes de entidades de classe, pesquisadores, cidadãos, tecnólogos e administradores municipais para partilharmos novos conhecimentos sobre como transformar nossas cidades. 

Numa cidade moderna, onde o planejamento, a administração e a governança são operados de forma participativa, maximizam-se as oportunidades econômicas, o ambiente social se transforma positivamente, fomenta-se a criatividade, novos investimentos são atraídos, contribui-se para a formação de capital intelectual, eleva-se a competitividade local, propicia-se mais segurança, garante-se a sustentabilidade ambiental, produz-se mais lazer e mais bem-estar para as pessoas.

Cidades somente se tornam melhores quando conseguem enfrentar seus desafios a partir de uma visão de planejamento participativo e integrado, uma visão que busque soluções inovadoras que estejam além do lugar-comum do atendimento isolado das necessidades da população. Cidade Inteligente é aquela onde o cidadão tem qualidade de vida.

Jorge Barros – CEO do Instituto SmartCity B. Americas, Presidente da Fiducia Domum Reengenharia Organizacional, foi Vice-Presidente Senior da Siemens do Brasil, Professor e Diretor-Adjunto Internacional da FGV. É graduado em Economia, tem MBA pela Duke University e Ph.D pela Florida University.

Referências:

Timmeren.A, Henriquez.L e Reynolds.A. Ubikquity&The Illuminated City. T.U Delft, 2015.
Isaacson, W. The Innovators. Simon and Schuster Paperbacks, 2014.
Revista SmartCity Business Brasil. The Way Comunicação, Edição Outubro de 2016.

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Redação

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