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Quem pode Pagar?

Houve um tempo em que a paixão pelo Futebol levava as famílias inteiras para ver um jogo. Nem precisava ser da série A, ou das divisões oficiais superiores da CBF. A TV era para ver novela, um filme ou outro. A ideia era que num final de semana, a pipoca, a charanga, os gritos, os palavrões e as explosões das arquibancadas lavassem a alma. Espaço para a alegria e descontração de todos.

Francisco Moura 

Rio de Janeiro – RJ – 21/03/2023

1,8 Minutos.

Não há ‘carioca’ digno desse título que não tenha ido, pelo menos uma única vez, ao Maracanã para ver o clássico mais clássico do futebol brasileiro. Digo isso porque o ato de ir ao estádio, atualmente uma raridade, representa um dos rolés mais cariocas que há – perdendo, talvez, somente, para as nossas caríssimas visitas à praia do Arpoador, em Ipanema.

O jogo de ida da semifinal do Campeonato Carioca de 2023, que ocorreu maldosamente em uma segunda-feira, foi, como todo Flamengo e Vasco, um acontecimento. Quem já viveu, sabe como é ser ofendido e ofender os outros gratuitamente, saindo, ao final da partida, extremamente aliviado – apesar de triste ou feliz. O poder do xingamento na purificação do eu é, talvez, o principal motivo pelo qual o carioca – versado na arte de xingar – vai ao estádio.

Quem pode pagar?
Quem pode ir ao estádio numa segunda-feira? (Img Web)

O que deveria causar desconforto é o fato de a torcida do Flamengo, apesar de nitidamente mais numerosa, ser menos enfática em seu torcer. Coloco a culpa disso, sem a menor hesitação, na crescente elitização do ato de ir ao estádio.

Há algumas décadas, mesmo há alguns anos, podia-se ir ao estádio com o troco que ficava na carteira. Eis o motivo de a torcida do Flamengo ser, atualmente, tão silenciosa em sua torcida: quem vai ao estádio não somente pode estar lá em uma segunda-feira à noite, como também pode desembolsar setenta (70) reais para tal.

Quem pode pagar?

Desculpar-me-ão os politicamente corretos: rico não sabe torcer. Não sabe. Não sabe porque não sabe o que é derrota na vida. Não sabe porque na terça, de manhã, não vai ter que pegar um ônibus lotado pra ir ao trabalho.

Não sabe o verdadeiro sentido do ato de ir ao estádio. Esse sentido ninguém ensina ao pobre: a gente descobre por conta própria.

A grande questão é que o preço da meia entrada para ver um jogo do Flamengo equivale a 5% do salário mínimo.

Esse, portanto, é o grande destacamento válido de ser feito. Afinal, ganhar do Vasco é rotina. Não há motivo para que eu me atenha a isso.

Francisco Moura – Licenciatura em Letras: Português e Literatura (UFRJ)

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Redação

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