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O poder simbólico do capital no Ocidente.

ARTIGO

Uma análise do simbolismo de Pierre Bourdieu e sua representação imagética capitalista nos campos de poder da sociedade contemporânea Ocidental. Devido à relevância do assunto, importante trazer a reflexão sobre o tema, sob a ótica dos autores Pierre Bourdieu, Richard Sennett e Giorgio Agamben, confluindo na visão de Guy Debord e a capitalização das imagens.

Edney Firmino Abrantes

Introdução

O simbólico trazido por Bourdieu é algo abstrato, oculto e invisível, mas, de fato, é utilizado por aqueles que frequentam os espaços e os campos, pela busca do troféu “poder”. Daí, a unificação dos termos Poder Simbólico, exercido por intermédio das relações sociais entre indivíduos e grupos.

Nessa linha, o poder simbólico de Bourdieu demonstra as relações sociais no bojo de um poder estruturante e a sua sinergia com o mundo, bem como o poder estruturado voltado para uma espécie de consenso, que forma certa hegemonia e que resulta em dominação.  Esta se legitima, após a sobreposição do poder simbólico de um agente sobre o outro, em meio aos conflitos e as tensões configuradas dentro de um sistema.

Após a formação desse sistema, se constrói uma realidade na concepção dos agentes dominadores. São produções de conhecimento e comunicação realizadas e ligadas a essa classe que exerce a hegemonia por consequência da identificação entre os seus membros, que se aproximam pelas suas semelhanças, lhes garantindo uma legitimação em suas ações.

Portanto, é o capital dominante que solidifica a legitimação da dominação dessa classe hegemônica. O exercício das ações dos agentes dominadores ocorre, dentro dos campos. São ambientes onde as relações sociais acontecem e os agentes se unem em grupos na busca do poder frenético rumo ao alcance do próprio capital simbólico como meta.

O objeto desse artigo se baseia no poder simbólico e a representação imagética do capital na sociedade Ocidental contemporânea. A pesquisa realizada sobre o impacto da imagem e sua representação capitalista nos espaços e campos de poder, deflagrou o seguinte questionamento: Como esses conflitos nas estruturas geram representações imagéticas capitalistas? O objetivo principal que norteou o trabalho foi identificar as maneiras que esses indivíduos e grupos se identificam por semelhança.

O corpus utilizado trouxe como suporte Pierre Bourdieu e sua obra “O poder simbólico”, considerada um clássico na sociologia, trazendo os conflitos nos espaços e campos de poder entre indivíduos e grupos, Richard Sennett e seu livro: “A Cultura Do Novo Capitalismo” com menção ao talento e o fantasma da inutilidade contemporânea, Giorgio Agamben e seu trabalho “O Que é o Contemporâneo e outros ensaios”, nos brindando com as teorias anacrônicas e sincrônicas da contemporaneidade, Karl Marx e seu evidente livro: “O capital” e sua relevância para os tempos atuais, e por fim, Guy Debord e seu livro: “A sociedade do espetáculo” e o fechamento desse artigo com uma definição de capital espetacularizado.

A metodologia aplicada foi à análise da imagem na teoria, semelhante à atividade de análise do discurso, mas, o objeto se dá na imagem e sua representação na estrutura capitalista de indivíduos e grupos em tensão. A imagem vai muito além do aspecto visual, pois, existe a perspectiva da intencionalidade do autor que a produz.

 Dorothea LangeDomínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=52734
Mulher refugiada e filhos. (Foto: Dorothea Lange )
O poder simbólico.

O poder simbólico tem várias interpretações e variações de acordo com o prisma que cada autor se identifica. Uma das observações é que a sua aplicação providencia uma espécie de ordem social. No caso de Pierre Bourdieu, a hermenêutica se dá por intermédio de dois fatores, ou seja, o político e a comunicação.

O político no sentido da organização social em que os símbolos, por excelência, auxiliam na integração da sociedade e o comunicacional, no sentido de contribuição (para uma melhor integração) fundamentalmente para reprodução da própria ordem.

Para que a sociedade toda ou parte dela absorva a simbologia disponível por leis, regras, convenções, usos, costumes e tradições, mitos, linguagens e imagens dentre outras, exige a relação entre as pessoas e as coisas. É importante que a simbologia existente esteja estruturada em um sistema de comunicação disponível e de fácil acesso.

Campos de poder.

No seio da sociedade, por um lado, as relações entre as pessoas e as coisas proporcionam uma construção da realidade humana. Tal efeito construtivo pode corroborar situações, conceitos, definições e lógicas ocasionando um consenso, mas pelo outro, gerar incertezas, conflitos e discordâncias, resultando em dissenso. Esse choque relacional tem efeito assimétrico e, embora sejam muitas vezes desproporcionais ou equilibrados ou não, são aceitos desde que, não ultrapassem os limites da sanidade social. Tudo isso é travado em determinados espaços que Bourdieu denomina de campos de poder.

Os campos de poder para BOURDIEU (1984) são consequências de processos assimétricos de diferentes correntes de pensamento, movimentos e classes sociais, que detém uma forma de ser e visão de mundo distinta. Acontece nesses espaços relações de força entre os indivíduos e grupos, bem como as instituições que lutam por seus direitos, na busca frenética pelo monopólio da autoridade e dominação de cada campo.

A luta simbólica externada nesses espaços se dá com intensidade entre as relações das diferentes classes e ou frações dessas mesmas classes, na busca da láurea do poder. A legitimação desse troféu só será possível a quem conseguir, após o exaurimento dos embates, fazer prevalecer a sua ideologia.

A imagem como representação do capital na sociedade brasileira contemporânea

A imagem costuma ter o significado raso de representação visual de indivíduos ou grupos ou objetos. Há duas vertentes originárias de sua concepção, ou seja, para Platão, emerge do campo das ideias, portanto, da projeção da mente e, para Aristóteles, a imagem trazia uma dualidade, aproveitando o idealismo de Platão, bem como o realismo empírico dos sentidos do próprio homem.

Nessa linha de raciocínio, temos uma hibridização imagética que deságua em inúmeros conhecimentos, dentre eles estão à arte, a filosofia, a sociologia e outros. O próprio senso comum, fez com que a imagem visual e seus conceitos e definições, fossem levados a esses domínios, figurando apenas como ideal e real.

Imagens e mentiras. O poder simbólico do capital no Ocidente.
Imagens e mentiras. O poder simbólico do capital no Ocidente. (Img. Internet)

Dentro da perspectiva capitalista, a imagem tem outro significado, pois, ela pode ser projetada no campo de domínio do consumidor, onde os desejos e as necessidades do indivíduo ou grupos sociais sejam aguçados por meio de propagandas de produtos.

Outra vertente se dá por intermédio de doutrinas ideológicas que são levadas sutilmente ao espectador, seja por intermédio dos espaços sociais como escolas, universidades, bem como pelas relações sociais e religiosas entre os atores em igrejas e templos, resultando em domínios dos agentes que se identificam semelhantemente e por fim, criando imagens e símbolos que representam os campos de poder.

Só é possível fazer uma análise da imagem e seus significados complexos nos tempos de hoje por conta da contemporaneidade de estudos e pesquisas de autores antigos e até clássicos, que são considerados contemporâneos, sejam por seus pensamentos, sejam por suas obras anacrônicas que, utilizados parecem sincrônicas, embora sejam de outras épocas.

Para AGAMBEN (2009), a contemporaneidade, portanto, é uma singular relação com o próprio tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distâncias; mais precisamente, essa é a relação com o tempo que esta adere através de uma dissociação e de um anacronismo. Nesse sentido, Platão e Aristóteles são aponta de lança na origem da análise da imagem e são necessários na contemporaneidade.

Dependência psicológica do capital

Assim, em meio à análise imagética do capitalismo e sua representação simbólica nos espaços e campos de poder, a que se entender a cultura capitalistas impostos em suas estruturas, principalmente, levados no campo do poder econômico que, embora seja mais um dentre vários, é o que delineia a direção financeira de indivíduos e grupos sociais, chegando ao ponto de, se a economia vai bem, esses agentes, em média, também vão bem, caso contrário, gera ruptura social que se iniciam nos espaços e campos por intermédio de conflitos e tensões travados.

SENNETT (2006), em sua obra: “A Cultura Do Novo Capitalismo” abre o Capítulo II, denominado “O talento e o fantasma da inutilidade”, trazendo a baila, justamente, uma imagem da Grande Depressão de 1930 nos Estados Unidos que causou enorme desemprego. Menciona uma das imagens mais marcantes dessa época é uma fotografia de vários homens amontoados na porta das fábricas fechadas a procura de emprego.

Relevante ressaltar que, o autor, em sua obra e, especificamente, nesse capítulo, traz a leitura fascinante de uma imagem visual chocante daquela época, sem ao menos fixá-la em sua obra, portanto, SENNETT reforça e corrobora que a imagem visual por si só, não comporta uma leitura completa.

Ele precisou do hibridismo, onde retratou a imagem visual dessa fotografia – sem postá-la em seu livro –, com o logos (Depois do contato que os gregos tiveram com outras culturas, a forma de ver a vida mudou. Tornaram-se conscientes da insuficiente explicação da palavra religiosa que inundava o mito. Agora, a palavra que explica o porquê de tudo é uma palavra carregada de racionalidade. O homem pensa pesquisa e decide por si próprio como explicar a realidade. Este novo discurso racional é conhecido como “logos”.) ou seja, com a escrita, que a complementou.

Sonho, futuro e realidade

Demonstrou o autor ser contemporâneo e, concomitantemente, fez uma belíssima leitura imagética da época da Grande Depressão, mostrando o quanto a cultura capitalista voraz (não diferente da atual) daquele período foi tão ruim a milhares de trabalhadores que sofreram com o desemprego, mas ao mesmo tempo, traziam algo positivo para o seu tempo, ou seja, esses indivíduos acreditavam num remédio pessoal para a inutilidade que transcendia qualquer panaceia governamental: seus filhos teriam uma educação e uma capacitação especial, capazes de fazer com que os jovens fossem sempre necessários, estivessem sempre empregados.

O capitalismo e sua representação imagética move montanhas para atingir seus objetivos, sendo o maior deles o lucro, e o público é o seu alvo. Em outras palavras, o capital estimula e alimenta a economia de um país ou de grande parte do mundo, por meio da alienação desse público, fazendo com que ele deseje aquilo que é lançado no mercado via teatralidade, enfim, uma espécie de ilusão como se fosse a realidade.

A mercadoria quando levada para o mercado desperta o fetiche (como técnica de indução do espectador), embasando-se naquilo que, supostamente, é bom; pois, para fisgar o consumidor pela propaganda, esta tem que demonstrar aquilo que é positivo e não o que é negativo, fazendo não apenas com que o consumidor a aceite, como também acredite que realmente o produto funciona.

Portanto, este se torna mercadoria e causa impacto quando oferecido. Além disso, MARX (1996), ressalta que os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, figuras autônomas, que mantém relações entre si e com os homens. Deixa claro, obviamente, com suas palavras, a existência real de um capital baseado nas relações do produto com os homens, despertando uma imagem fantasmagórica.   

Não há mais nada que determinada relação social entre os próprios homens que para eles aqui assume a forma fantasmagórica de uma relação entre coisas. Por isso, para encontrar uma analogia, temos de nos deslocar região nebulosa do mundo da religião. Aqui, os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, figuras autônomas, que mantém relações entre si e com os homens (MARX, 1996, p.198), (Grifos nossos).

Contudo, a contemporaneidade tem demonstrado que a sociedade do espetáculo avançou, evoluiu negativamente, pois se antes baseava apenas no fetiche da mercadoria lançada (palpável e real); atualmente, aquilo que é irreal, artificial, quando lançado pelos canais disponíveis da mídia em geral e pela técnica teatral também é, muitas vezes, considerado real e compartilhado como se de fato existisse.

Enfim, DEBORD (2012), desenha o capital como um espetáculo e o seu resultado representativo e simbólico são as imagens acumuladas. O capital espetacularizado, proporciona a fabricação concreta de alienação.

O poder simbólico do capital no Ocidente, espetacularizado, proporciona a fabricação concreta de alienação.
O poder simbólico do capital no Ocidente, espetacularizado, proporciona a fabricação concreta de alienação. (Img. Internet)
Considerações finais.

Independentemente do homem, dentro do processo mental de estruturação e armazenamento das imagens e representações, adquirir (ou por herança, mitos, usos, costumes, tradições, crenças, valores, ou espírito, dentre outros), acima de tudo há que se ter o respeito às pessoas e a seus acervos imagéticos.

Pela dinâmica tecnológica, o uso das imagens e suas representações fizeram crescer o maniqueísmo entre o amor e o ódio, o sensato e o insensato, o honesto e o desonesto, vide a quantidade anormal de fake news que são projetadas e lançadas pelo homem, ocasionando aquilo que Hobbes temia que fosse uma guerra de todos contra todos, momento este em que o pensador sugeriu a criação do Leviatã como uma forma de reger o animal do seu estado de natureza para o estado de direito.

Nota-se que, a internet e suas plataformas digitais foram essenciais para o manejo e facilitação do homem em sua vida, com uma comunicação mais célere por um lado, mas por outro, uma enorme responsabilidade no seu trato, pois, tudo fica registrado, seja por quem emite, seja por quem recepciona as mensagens.

O próprio sistema proporciona isso, mesmo que se delete, existe o acesso para a busca. Na atualidade, as imagens e suas representações são livres ou são manipuladas dentro dos campos de poder na busca pelos troféus? Vivemos ou não em meio à sociedade Ocidental do espetáculo, sendo o capital também espetacularizado? Tirem as suas próprias conclusões!

Edney Firmino Abrantes
Advogado e Cientista Político. Mestre em Ciências Humanas pela UNISA e Doutorando em Comunicação Social pela UMESP.
Professor visitante da ECA/USP – Produção de Textos Persuasivos.


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Redação

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2 thoughts on “O poder simbólico do capital no Ocidente.

  • Ahmed Omar Hamden Neto

    Gostei, preciso ler o artigo mais vezes publicado por Vc, para uma maior compreensão ou melhor estuda-lo. Exemplificando:a imagem,seja de um indivíduo (pessoa humana) ou de um produto contemporâneo tem que ser bem estudada, planejada, pra que atinja ao máximo o alvo a que se propõe.TBM gostei sobre o sufixo grego LOGOS. Alguns homens questionando os dogmas que muitos ainda crêem, criando a própria ciência e estudo: Geólogos(estudando a composição físico-química do planeta Terra), Psicólogo s , Cosmologos, etc… Parabéns, faz tempo que eu não interpretava um artigo desafiador

    • Obrigado! que bom que gostou! Continue lendo nossa revista. Dissemine entre os conhecidos de sua rede social.
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