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Um Buraco Negro Social

Astrofísica de uma fenomenologia. Em três tempos, voltando do Detran SP onde fui tentar a primeira habilitação. Aos 57 anos (mero detalhe técnico!) Logo se vê que este é um texto ‘antigo’…

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São Paulo, 27/12/2022.

3 Minutos.

Não aceitaram, por duas vezes, meus comprovantes de endereço por falta de data. Que se dane! Sou velho! Adoentado… Por que preciso de automóvel, se posso ir de metrô, de ônibus, ou com algum esforço conseguir um Uber ou um taxi… todos tão eficientes!? (sic)

Já na ida, e então na volta, pela mesma calçada, entre transeuntes e camelôs com seus produtos, espanto-me com uma lona estendida que oferecia punhais e facas de corte – do tipo ‘Rambo assassino silencioso’ – com empunhadura, gatilho, e lâminas de aço afiadíssimas…

Achei estranho! Não há fiscalização? Nenhuma? Ingenuidade pura! Voltei pensando no assunto. Parei na catraca da estação porque o bilhete tem um tempo de espera para poder ser reutilizado.

Neste ínterim pude observar uns “nóias” andarilhos naquela praça desumana da estação Armênia do Metrô.

Sempre imaginei que como homenagem àquele gente – batizaram a praça com o nome do país – merecessem receber um território mais rico pela sua história e sofrimento (a que nos contam sobre eles, pelo menos – já que apenas, possivelmente, a elite abastada daquele lugar conseguiu fugir às invasões turcas das guerras passadas). E vieram parara logo ali?!

Entre os “nóias” (explico: gíria adaptada e redutiva de paranoicos que diz de drogaditos “irrecuperáveis”,  perturbadores das pessoas buscando conseguir algum dinheiro para comprar drogas dos muitos traficantes da área),  pequenos mequetrefes que vivem de vagabundagem perambulando e  de expedientes ilegais, fizeram-me lembrar das cenas retratadas por D.H.Lawrence da Londres de 1919, Arthur Conam Doyle (o Machado de Assis britânico), em Oscar Wilde, ou em filmes e outros livros que já andei vendo\lendo.

Como canções na chuva

A história demora a passar ou se repete, mesmo como farsa, disse o cientista-filósofo histórico dialético terror dos capitalistas. Deve ter sido assim também na Roma 300 d.C. (os poemas de Ovídio, pelo menos, penso eu, retrata alguns destes detalhes metamórficos), quando o império entendeu e aplicou o tratado\estratagema político-social de Jesus Cristo.

Um Buraco Negro Social
Gilgamesh – Mito herói persa – Construtor de Civilizações. (Img. Web)

Busca umas pedrinhas pra gente!” Disse um dos três menores (carinhas de estudantes pequenos, pardos e magros de escola pública gazeteando aula, ou simples meninos já sem rumo na vida – capitães de asfalto – isca de polícia e da malandragem mais ‘afinada’), ao entregar dinheiro para outro, maior de idade, também magro, maltratado, alto, mas que se trajava como todos – roupas velhas, blusas, camisetas, bermudas e calças sujas e surradas, bonés, capuzes e mochilas nas costas. O uniforme da miséria social!

Decidi entrar no metrô com eles na mente; um dia algum daqueles sobreviventes poderá ser qualquer coisa na vida, afinal vivemos numa democracia meritocrática (certo?) cujo sistema oportuniza iguais condições para todos que queiram “vencer na vida”!

Um soldado, um policial, um professor, advogado ou juiz, um engenheiro ou arquiteto, um médico, enfim… Tivemos até um presidente técnico torneiro mecânico (uma raridade, admitamos!)

Claro que ele foi um escolhido meticulosamente, como o Jesus lá de Nazaré (“aquela terra de onde nada de bom poderia sair”), pois alguém percebeu nele as qualidades necessárias e suficientes para torná-lo no que se tornou. Quem lhe deu esta oportunidade?

Talvez o romano Pôncio Pilatos! Quem sabe!? Um cara capaz de lutar a favor dos menos afortunados merece certo destaque, e resistir contra o sistema imposto pelas elites romanas, guerreiras, imperialistas, e cruéis…

Uma reconstrução imperial

Pelo menos foi assim que nos ensinaram sobre o Cristo, o abençoado, o ungido, o protegido de Deus, que talvez fosse como um daqueles gregos (de onde se traduziu seu nome ‘Christos‘) semideuses, humanos com poderes especiais e proteção franqueados por deuses e origem divina.

Foi pensando assim que vi dois carinhas entrarem no mesmo vagão em que eu viajava, não para venderem pequenos aparelhos roubados ou cacarecos semi-eletrônicos, naturalmente aliviados das cargas do Porto de Santos e ou traficados do Paraguai, numa boa pela Ponte da Amizade, do tipo bem característico de propaganda não acadêmica, você sabe: pen drives, fones de ouvidos, capinhas para celulares e documentos, três por cinco etc…

Não! Estes caras entraram (e isso também já é comum) carregando instrumentos musicais: um com seu violão e outro com seu violino. Jovens, apresentaram-se como ‘artistas de rua’ e tocaram muito bem (sou exigente!) um clássico batido da pop rock norte-americana dos anos 70 “Dust in the Wind” do grupo Kansas, e depois uma do Luiz Gonzaga, porque aqui é a terra da fusão universal (dizem os acólitos de Sérgio Buarque de Holanda). Enfim, foram aplaudidos e passaram o chapéu.

Mas, não lhes dei nada, não ando com dinheiro no bolso, apenas sorri quando o violinista ao me olhar reconheceu pelo meu gesto a minha aprovação, e sorriu de volta! Outros capitais.

Um Buraco negro social
Uma busca eterna por espaços dignos (Img. Web)
Civilidade até onde?

Desci do trem pensando que se eu tivesse um carro não teria visto tais coisas.

Não teria sequer a chance de pensar nelas como um caldo fervente e agudo, aquecido pelo anseio das tantas almas perdidas à procura de algo, em um desespero natural que nenhum sistema humano será capaz de oferecer solução.

Por mais que alguns tenham tentado e se esmerado em reconhecer a necessidade urgente de um projeto social, um conjunto, um repertório de aproximações culturais capazes de gerar um sentido civilizatório.

Meu ouvido interno gritou: “Dante saindo do Inferno e andando pelo Purgatório, pelo menos tinha um guia!”

E imediatamente a imagem das facas assassinas, frias e silenciosas na barraca de rua, me vieram à mente! Quem nos guia hoje?

Nenhuma civilização que se baseia no uso de armas (brancas ou de fogo), feitas para matar seus semelhantes merece este nome! Podem até ter um enorme repertório cultural e praticá-los sob a égide de um sistema legal\judiciário proibitivo\punitivo, seguir uma ética e padrões de acordo com o quê e onde vivem, mas jamais serão civilizados!  Serão ilegítimos, sempre.

Não alcançarão à glória dos deuses! Por mais que busquem a perfeição, por mais que repitam a busca, desde o grande dilúvio bíblico, e talvez até antes dele, como nos é narrado em Gilgamesh, em sua luta contra o monstro sagrado que o persegue, serão sempre o que são: metade animal feita do que tirarem da terra e da incapacidade de preservarem-na como ela merece!

Por que tem uma fome imorredoura, infinita! E uma pergunta ficou pulando na minha cabeça como um “kangaroo” australiano na planície: – “Afinal, o que é mesmo que os seres humanos querem? Será que é Vida?” Então, agora me digam que diabos é esta Vida?

Não deve ser a sua…

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Redação

ÆscolaLegal é um esforço coletivo de profissionais interessados em resgatar princípios básicos da Educação e traduzir informações sobre o universo multi e transdisciplinar que a envolve, com foco crescente em Educação 4.0 e além, Tecnologia/Inovação, Sustentabilidade, Ciências e Cultura Sistêmica. Publisher: Volmer Silva do Rêgo - MTb16640-85 SP - ABI 2264/SP